Com somente dois deputados distritais presentes na reunião realizada na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) na manhã desta quinta-feira (10), os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a poluição do Rio Melchior não avançaram. Em razão da falta de quórom, não foi possível votar os 35 requerimentos da pauta.
Dentre os pedidos que tiveram a votação adiada, há convites para depoimentos de autoridades e especialistas, além de requerimentos relacionados à visitas técnicas ao rio. Apenas a presidenta da CPI, deputada Paula Belmonte (Cidadania), e o deputado Gabriel Magno (PT-DF) compareceram à segunda reunião da comissão. A nova data da reunião ainda não foi divulgada.
Belmonte cobrou dos membros da CPI maior comprometimento com a pauta. “Peço gentilmente para os parlamentares que se colocaram à disposição de auxiliar o povo daquela região, e com certeza com reflexo em todas as regiões do Distrito Federal, possam ter a sensibilidade humana de vir aqui. E se não tiverem uma afinidade com o tema, que possam abrir vaga para os outros [deputados]”, declarou. “Isso aqui não é uma agenda ideológica, isso é uma agenda humanitária”, concluiu a presidenta.
Tanto Belmonte quanto Magno destacaram que os deputados se colocaram à disposição para participar da CPI voluntariamente. Cada bloco parlamentar indicou um representante para compor a comissão. O vice-presidente da CPI, Joaquim Roriz Neto (PL), o relator Rogério Morro da Cruz (PRD) e o deputado Daniel Donizet (MDB) não compareceram ao encontro. Apenas Donizet justificou sua ausência por razões médicas.
“Essa CPI tem fundamentalmente o intuito de apurar e investigar as falhas ou a falta por parte do poder público ou dos responsáveis no cuidado com as pessoas”, relembrou Magno. “Nós estamos falando de um rio importante no Distrito Federal, que foi tratado com falta de cuidado nos últimos vários anos, até chegar nessa situação. De um rio hoje que está na classificação 4 de poluição, que atinge não só o conjunto do ecossistema da capital da República, mas fundamentalmente as outras pessoas que ali vivem e dependem não só dos recursos hídricos, mas do conjunto da dinâmica do ecossistema nessa região, numa região muito populosa, onde se concentra a maior parte da população do DF”, afirmou.
O que a CPI investiga?
O Rio Melchior está localizado entre as regiões administrativas de Samambaia, Ceilândia e Sol Nascente, e deságua no Rio Santo Antônio do Descoberto. As águas do Melchior foram classificadas pelo Conselho de Recursos Hídricos do Distrito Federal na categoria mais crítica de contaminação (Classe 4), proibindo qualquer contato humano, atividade de pesca ou irrigação.
A CPI do Rio Melchior foi criada em fevereiro de 2025, após anos de apelos da população e de movimentos ambientalistas, com o objetivo de investigar as causas da contaminação da água do rio, além de apurar a omissão de órgãos fiscalizadores e as empresas envolvidas no despejo de resíduos no local. Atualmente, o rio recebe dejetos da rede de esgoto, do aterro sanitário de Brasília e do abatedouro da empresa JBS. Além disso, o Melchior vive sob nova ameaça: a construção de uma usina termelétrica, que utilizará a água do rio para resfriamento do reator e outras atividades.
O tema também deve ser analisado pela CPI, como relembrou Magno na reunião desta quinta-feira (10). “Se engana quem acha que a termelétrica vai afetar a qualidade de vida só de quem mora lá perto, o que já seria inaceitável, mas afeta a qualidade de vida do conjunto da população do Distrito Federal. Todos os dados e as pesquisas mostram impacto ambiental, para a saúde e inclusive econômico que uma termelétrica tem”, afirmou o parlamentar.
De acordo com relatório de impactos do Instituto Arayara, a Usina Termelétrica Brasília, projetada pela Termo Norte Energia Ltda, será responsável por uma perda diária de 144 mil litros de água do rio Melchior.
A Adasa emitiu uma outorga prévia que autoriza o uso dos recursos hídricos do Melchior pela usina, decisão criticada pelo Arayara. No documento, ao qual o Brasil de Fato DF teve acesso, o órgão permite à Termo Norte a captação de até 30 litros por segundo, 24 horas por dia. Segundo a outorga, a permissão foi dada com base em dados de vazão do rio de mais de dez anos atrás, presentes no Plano de Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos do DF (PGIRH/DF) de 2012.
Para o engenheiro John Wurdig, o uso de dados tão antigos para conceder o uso das águas é problemático. “No contexto de 2024, por exemplo, o rio não teria essa vazão”, avaliou. No ano passado, o DF viveu a maior seca da história, com 167 dias sem chuva. “A CPI precisa avaliar os cenários de passado, presente e futuro. Então não adianta lutar pela despoluição do rio Melchior construindo uma termelétrica”, defendeu o gerente do Arayara.