A Assembleia Nacional da Venezuela aprovou nesta quinta-feira (10) o decreto de emergência econômica para o país. A medida foi proposta pelo presidente Nicolás Maduro em resposta ao anúncio das tarifas impostas pelos Estados Unidos a 185 países, incluindo uma taxa de 15% para os produtos venezuelanos.
Além disso, os EUA também ameaçaram impor uma taxa de 25% para os produtos de qualquer país que compre petróleo venezuelano. Em resposta, Caracas elaborou nos últimos dias o decreto que permite ao governo uma margem de manobra para tirar algumas burocracias e agilizar medidas sem depender da aprovação do Congresso.
Ao todo, o estado de emergência tem 10 tópicos. O primeiro deles é a autorização para que o Executivo emita algumas regulamentações excepcionais e temporárias para restaurar o equilíbrio econômico e “proteger os direitos da população”.
O documento determina o fomento à substituição de importações. Para isso, estabelece mecanismos percentuais de compras obrigatórias de produtos nacionais. Outro objetivo é fortalecer a produção nacional e estimular investimentos do setor privado interno e externo voltadas ao setor produtivo.
A medida autoriza contratações necessárias para garantir “a restauração dos direitos fundamentais da população” e permite gastos excepcionais do Tesouro Nacional, que não estavam previstos no orçamento anual de 2025.
O texto também autoriza a suspensão da cobrança de uma série de impostos nacionais, estaduais e municipais. Além disso, permite ao governo estabelecer mecanismos para combater a evasão fiscal, a sonegação, favorecer a produção nacional, promover o investimento nacional e estrangeiro e autorizar contratações necessárias para o acesso à serviços essenciais.
Toda a arrecadação de impostos será concentrada no Tesouro Nacional, que também pode redirecionar recursos de outros fundos para áreas prioritárias. Com isso, está suspensa a garantia constitucional das reservas legais.
Por último, o documento também permite operações de crédito público e o aumento da dívida pública sem que isso incorra na lei de responsabilidade venezuelana.
O decreto terá duração de 60 dias, podendo ser prorrogado por mais 60. O documento está respaldado nos artigos 336, 337, 338 e 339 da Constituição, que permitem ao governo venezuelano utilizar esse tipo de medidas quando surgem “circunstâncias econômicas extraordinárias que afetem seriamente a vida econômica da nação”.
Segundo a vice-presidente da Venezuela, Delcy Rodríguez, os EUA começaram uma guerra econômica sem pretendentes que pode ter um impacto “muito ruim” não só para a economia global, como também para o próprio país.
“Esse é um tiro no próprio pé dos EUA. Porque aliados e não-aliados foram afetados por essa política que muda o curso das relações comerciais e financeiras internacionais. A quem pensa que não será afetado está completamente errado. Já teve um impacto na bolsa mundial, que indica a queda do sistema financeiro”, disse.
De acordo com ela, essas medidas alteram tanto a economia global que podem levar a uma recessão mundial. Ela usou o exemplo do preço do petróleo, que atingiu nesta semana o valor mais baixo em 4 anos. O petróleo brent estava sendo vendido na terça-feira a US$ 63,30 (cerca de R$ 373), uma queda de 3,5%.
Segundo o governo venezuelano, a meta é manter a produção petroleira com esforço próprio para conseguir superar não só as tarifas, como as sanções impostas pelos EUA e que ganharam força com Trump.
O presidente da Assembleia Nacional, Jorge Rodríguez, disse que o decreto vai proteger todos os setores econômicos do país e, no final, será uma proteção para o povo venezuelano.
“O decreto é para proteger empresários, a arrecadação de impostos, importações, produtores… Em resumo, é um decreto para proteger a população venezuelana. Não tenho dúvidas de que, assim como derrotamos a pandemia da covid, vamos derrotar o vírus do imperialismo mundial”, disse.
No entanto, internamente o discurso não é de otimismo. O Brasil de Fato ouviu de dirigentes do governo a percepção de que, se os EUA decidirem manter a proibição da venda do petróleo venezuelano, a situação econômica do país poderá ficar muito prejudicada.
A visão é de que o estado de emergência econômica dá uma margem de manobra para o governo, mas está longe de resolver uma situação que é imposta de fora pra dentro e que pode levar o país a uma crise parecida com o que foi 2017.
O deputado Rodolfo Eduardo Sanz (PSUV) concorda com essa percepção. Para ele, a meta de Trump é frear o crescimento da China, ainda que isso seja irreversível a partir de agora. O congressista afirma que esse projeto acaba funcionando como um “guarda-chuva em uma tempestade”: você se molha de qualquer maneira, mas minimiza os danos.
“Esse guarda-chuva mitiga os efeitos severos dessa medida de Trump. De alguma maneira vai proteger um ou outro setor, mas não vai manter o equilíbrio interno de maneira plena. É necessário, mas apenas reduz alguns efeitos se a situação ficar muito pior, já que o estrago é inevitável se a Venezuela ficar totalmente proibida de vender petróleo”, afirmou ao Brasil de Fato.
Opositores também entendem que o projeto é importante. O deputado José Gregorio da Ação Democrática afirma que a medida de Trump afeta diretamente a população venezuelana.
“A produção precisa subir, mesmo em nessa situação. Temos alguns setores que já têm uma boa produção e essa emergência econômica facilita a exportação desses produtos, mesmo em uma situação de caos”, disse ao Brasil de Fato.
A pressão de Trump sobre a Venezuela não se dá somente com as tarifas. No mês passado, a Casa Branca anunciou o fim da licença para que a petroleira estadunidense Chevron atue na Venezuela. A companhia é responsável por 20% da produção e exportação de petróleo no país.
Depois disso, ele revogou as licenças para outras empresas petroleiras para exportarem gás na Venezuela. A medida afetou a espanhola Repsol e a italiana Eni, que também extraíam gás no país caribenho.
O republicano usa como argumento uma “não colaboração” de Caracas para receber os migrantes venezuelanos que vivem nos EUA e estão sendl deportados por Washington.