Uma pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública indica que 37,5% das mulheres brasileiras já sofreram ao menos algum tipo de violência física, sexual ou psicológica.
O dado alarmante foi apresentado pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em vídeo gravado para o painel de abertura do Festival Mulheres em Luta (MEL), que teve início nesta sexta-feira (11), em São Paulo (SP).
“A ideia de ódio contra as mulheres tem consequências práticas e altamente destruidoras das vidas, das capacidades, da autoestima e de uma série de outros fatores”, ressaltou a ministra Marina Silva, na fala exibida no telão do evento antes do início da mesa de abertura.
Com o tema Qual a razão do ódio contra as mulheres?, o primeiro debate do evento teve a participação de Alice Evans, cientista social e pesquisadora no King’s College de Londres e da ativista, pesquisadora e escritora Sohaila Abdulali. As ex-deputadas federais Manuela D’Ávila e Áurea Carolina participaram da conversa.
Autora do livro Do que estamos falando quando falamos de estupro, Abdulali apresentou reflexões sobre a cultura do estupro, definida por ela como “irmã do extremismo político”. “As duas são formas de nos dominar pelo poder e pelo desrespeito”, disse.
A pesquisadora ressaltou que, com fortes raízes culturais, a cultura do estupro extrapola as ideologias e posicionamentos políticos. “Lembre-se que cultura do estupro é muito democrática. Ela não tem partido. Governos vão e vêm, e temos que nos preocupar com os homens autocráticos, mas também temos que nos proteger dos homens feministas”.
Com uma análise calcada em dados, Evans apontou a desigualdade social causada pelo colonialismo e o fraco estado de direito como alguns dos fatores causadores da violência contra as mulheres.
“É importante compreender a retaliação patriarcal, é importante compreender a misoginia, mas, na minha análise, o mais importante é reduzir a violência e construir um Estado forte”, disse.

Realizada num palco montado na rua Vicente de Carvalho, no bairro Cambuci, a mesa de abertura encheu o quarteirão. Na plateia, havia parlamentares, militantes, pesquisadoras, ativistas e pessoas interessadas em partilhar reflexões sobre gênero. As mulheres eram maioria.
Camilla Marques, Secretária de Mulheres do Município de Contagem (MG), afirmou que o debate a instiga a pensar caminhos para as políticas públicas no município.
“As duas palestrantes que nós tivemos agora trouxeram uma perspectiva importante do papel do Estado no combate a essa violência, que é estruturante. Agente a gente sabe disso, mas a gente não vê a dimensão que isso tem”, disse.
A mesa de abertura, que debateu o ódio contra as mulheres, contaria com a participação da ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara. No entanto, Sônia precisou ficar em Brasília em decorrência da violência sofrida por indígenas participantes do Acampamento Terra Livre, vítimas de violência policial. Na noite de quinta-feira (10), policiais militares atiraram bombas de gás contra parte dos manifestantes. Entre eles, estava a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG).
Sônia Guajajara deve comparecer ao festival neste sábado (12).
Articulação inédita
Na abertura oficial do MEL, realizada na tarde desta sexta-feira na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), junto com o Encontro de Procuradorias da Mulher e representantes de Comissões de Defesa da Mulher e Frentes Parlamentares, as participantes estabeleceram uma articulação inédita no país.
O mandato coletivo da Bancada Feminista do Psol na Alesp, formado por cinco mulheres negras, junto com o Instituto E Se Fosse Você?, fundado por Manuela d’Ávila, foram as responsáveis pela promoção do espaço. Estiveram presentes mais de 200 pessoas, sendo 85 parlamentares de 17 estados, 47 cidades e dez partidos
O encontro promoveu o compartilhamento de estratégias e políticas públicas em diferentes estados e municípios, debateu o aprimoramento da atuação no combate à violência de gênero e apresentou projetos prioritários por território.
“Essa articulação nacional demonstra o interesse em fortalecer as diferentes instâncias legislativas na luta pela garantia de direitos das mulheres. Estamos orgulhosas em promover esse encontro que, com certeza, será o primeiro de muitos”, Paula Nunes codeputada da Bancada Feminista do Psol.
A programação do MEL vai até domingo (13). O evento terá discussões sobre emergência climática, políticas de cuidado, acolhimento especializado para mulheres vítimas de violência, construções de agendas progressistas sobre economia e desenvolvimento sob a ótica das mulheres, entre outros assuntos.