Fazer compras no supermercado, seguir instruções ou placas para encontrar um endereço, tomar o remédio correto ou se comunicar com familiares pelo Whatsapp. São todas tarefas cotidianas elementares para o nosso dia a dia. Mas elas são muito prejudicadas quando a pessoa não sabe ler. O analfabetismo é um problema que afeta 960,9 mil pernambucanos com 15 anos ou mais, segundo o Censo 2022 do IBGE. Mas uma parceria entre a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e movimentos populares promete atuar sobre esse problema.
A universidade e a Campanha Mãos Solidárias foram o ponto de partida para a Jornada Nacional de Alfabetização nas Periferias. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística indicam uma taxa de analfabetismo de 13,4%, quase o dobro dos 7% da taxa nacional. Mas o índice é ainda pior a depender do grupo social ou região geográfica à qual você pertence, expondo as desigualdades de oportunidades de acesso à educação.
Nacionalmente, 8,8% das pessoas pardas são analfabetas, mais que o dobro da taxa de pessoas brancas (4,3%) nesta situação. Pessoas pretas (10,1%), nordestinas (14,2%), indígenas (20,8%) e quilombolas (25,9%) apresentam índices ainda mais alarmantes de pessoas excluídas do letramento. Isso levou o direcionamento da iniciativa para as periferias das grandes cidades e à ampliação do alcance para os nove estados da região Nordeste, além de turmas em Minas Gerais e São Paulo.
A expansão foi viabilizada pela Secretaria de Educação Continuada e Alfabetização de Jovens e Adultos (Secadi), do Ministério da Educação. A iniciativa dos movimentos populares e da UFPE integra o “Pacto EJA” pela Superação do Analfabetismo, do MEC. Também foi ampliado o leque de organizações da sociedade civil que somam forças na campanha: Movimento Sem Terra (MST), Movimento Brasil Popular (MBP), Levante Popular da Juventude, Movimento dos Trabalhadores por Direitos (MTD), Movimento Camponês Popular (MCP).
Em Pernambuco, o projeto já montou 197 turmas espalhadas por Recife, Olinda, Jaboatão, Camaragibe, Caruaru e Petrolina. A expectativa é alfabetizar entre três e cinco mil pessoas no estado. Na capital são 67,1 mil pessoas (5,5% da população) que não são alfabetizadas, em sua maioria vivendo nas periferias. A Jornada de Alfabetização terá 40 turmas espalhadas pela “grande Casa Amarela”, na zona norte da cidade. Mas um atraso na liberação de verbas levou ao adiamento do início das aulas – anteriormente previstas para março e que agora só devem começar em maio.
Em MG, jornada de alfabetização de jovens e adultos está com matrículas gratuitas abertas
A jovem Juliana Caroline é a alfabetizadora responsável por uma das turmas no bairro do Vasco da Gama. Ela se diz empolgada para o início das aulas. “Esse projeto vai fazer uma grande diferença na vida de muita gente”, afirma. Ela dará aula para 16 adultos na sede dos Alcoólicos Anônimos no bairro. “Sei que é uma metodologia nova para a capital, mas é eficaz e sabemos que já funcionou para superar o analfabetismo noutros países e aqui no Brasil. Espero que nos ajude também”, completa Juliana.
A alfabetizadora popular está falando do método cubano “sim eu posso”, desenvolvido pelo Instituto Pedagógico Latino-Americano e Caribenho (Iplac), na década de 1990, e colocado em prática em Cuba. No Brasil, tem sido usado pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) desde 2006, sendo usado também por projetos do poder público no Maranhão e em Maricá (RJ). A jornada até a alfabetização dura cinco meses.

“A ideia é que a alfabetização vá ao encontro das pessoas, sem que elas precisem sair dos seus bairros para ir às escolas. Vamos fazer salas de aula em garagens, igrejas, associações de moradores, para alfabetizar dentro das comunidades, com apoio das lideranças locais”, explica Paulo Mansan, coordenador nacional da Jornada. “A alfabetização é uma ferramenta essencial para a inclusão social e o exercício da cidadania”, completa ele.
Mansan parafraseia Paulo Freire para falar da jornada: “Queremos ajudar as pessoas a lerem as letras e a lerem o mundo, contribuindo para as pessoas conseguirem entender melhor como a sociedade funciona, para conseguirem estruturar melhor suas vidas.”
Paulo, que é filósofo, mestre em sociologia, especialista em educação do campo e doutor em agroecologia acredita que a campanha se soma a um “processo maior, que envolve iniciativas populares de saúde, cultura, cozinhas populares, bancos de alimentos, hortas comunitárias”, diz. “São formas de construirmos esse tecido de organizações que tenham compromisso com o protagonismo da classe trabalhadora.”
Nacionalmente são mais 1,3 mil turmas, com um alfabetizador responsável por cada, auxiliados por coordenadores pedagógicos, mobilizadores sociais, coordenadores de turmas e o acompanhamento de comunicadores populares. Mais de 200 deles se reuniram no Centro de Formação Paulo em Caruaru (PE), no fim do mês de março. O plano é alcançar os 18 mil alfabetizados.
Em Pernambuco, pessoas do Recife, Olinda, Jaboatão, Camaragibe, Caruaru e Petrolina que estejam interessadas em integrar uma turma devem entrar em contato com Lenice Moura no número (81) 982124730.
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