Considerado um dos papados mais progressistas, a gestão de Francisco à frente da Igreja Católica também esteve próxima dos movimentos populares. Durante os 12 anos em que esteve no posto, o papa se encontrou diversas vezes com lideranças populares mundiais, e reforçou sua mensagem de apoio na luta por terra, teto e trabalho.
Relembre os momentos em que o papa se encontrou com líderes da luta popular.
Encontro Mundial de Movimentos Populares
Em 2013, surgiu o Encontro Mundial de Movimentos Populares (EMPP), um espaço de união e diálogo entre movimentos populares ao redor do mundo e a Igreja Católica. A ideia da plataforma partiu do próprio papa Francisco, que, segundo ele, gostaria que pobres e povos organizados tivessem voz dentro da instituição católica.
A primeira reunião ocorreu em novembro de 2014, no próprio Vaticano, e, além de uma enorme lista de movimentos dos cinco continentes, contou com a participação do Movimento Sem Terra (MST) e da Via Campesina, representadas pela liderança do MST, João Pedro Stédile. O EMPP teve três edições, sendo a última em 2016.
“No primeiro encontro, a base do debate foi a realidade e a causa dos problemas que vivem os trabalhadores nas três esferas da luta social. Foi apresentado um amplo diagnóstico e reflexões sobre as saídas necessárias. Usando sempre o método ver-julgar-agir. O Papa Francisco construiu um documento, que, na essência, se resumiu na defesa de um programa do que não deveríamos ter mais: “Nenhum camponês sem terra; nenhum trabalhador sem direitos; e nenhuma família sem moradia digna!”, escreveu Stedile sobre o encontro em 2016.
Encontro com Evo Morales
Em 2018, Francisco se encontrou pela quinta e última vez com o então presidente boliviano Evo Morales, no Palácio Apostólico, no Vaticano. À época, os encontros tinham como objetivo reforçar o apoio do papa, como representante da Igreja Católica, no progresso cultural e social do país. Durante troca habitual de presentes, o pontífice deu para Morales o medalhão do Anjo da Paz, com o inscrito “Trabalhar por um mundo de solidariedade e paz, formado sobre a justiça”.
Francisco se encontrou algumas vezes também com o presidente venezuelano, Nicolás Maduro. Encontros entre os dois para discutir a situação política e econômica venezuelana e a preocupação com a migração foram alguns dos temas abordados pelo papa com o sucessor de Chávez.
Pandemia da Covid-19: “Continuem a luta”
Em meio à pandemia da Covid-19, papa Francisco imortalizou diversos momentos, como rezar pela humanidade em uma Praça São Pedro completamente vazia, no fim de março de 2020. Um mês depois, em abril, durante o feriado de Páscoa, o pontífice reforçou o seu apoio às lutas populares. “Continuem a luta e se cuidem como irmãos. Rezo por vocês, rezo com vocês”, escreveu em carta.
“Se a luta contra a Covid-19 é uma guerra, vocês são um verdadeiro exército invisível lutando nas perigosas trincheiras. Um exército que conta apenas com as armas da solidariedade, da esperança e do sentido de comunidade que renasce nestes dias nos quais ninguém se salva sozinho. Vocês são, para mim, como lhes disse em nossos encontros, verdadeiros poetas sociais que, a partir das periferias esquecidas, criam soluções dignas para os problemas mais urgentes dos excluídos”, acrescentou o papa progressista.
Encontro em 2024 com líderes da sociedade civil
Em maio do ano passado, o papa Francisco se encontrou com diversos representantes da sociedade civil engajados na construção da paz, e contou com a presença de 12,5 mil pessoas.
Neste encontro, João Pedro Stedile discursou para o papa Francisco na cidade de Verona, na Itália. Em sua fala, Stedile citou o bispo Pedro Casaldáliga, que teve atuação de destaque na defesa dos direitos humanos, em especial das populações marginalizadas.
“Malditas sejam todas as cercas. Malditas todas as propriedades privadas que nos privam de viver e de amar”, discursou Stedile. Na mesma cerimônia, o papa Francisco abençoou a bandeira do MST.
Proximidade com as Mães da Praça de Maio
Hebe de Bonafini, líder das Mães da Praça de Maio, sempre teve uma postura crítica sobre a Igreja Católica, sobretudo pela postura da instituição durante a ditadura militar na Argentina.
No entanto, manteve contato próximo com o seu conterrâneo argentino. “Rezo por você e pelas Mães e peço que o Senhor vos conserve com saúde para que continueis a ajudar tantas pessoas”, escreveu Francisco em 2016 para a ativista.
Ainda no mesmo ano, a pedido do próprio papa, Bonafini foi até o Vaticano. Segundo ela, a conversa de duas horas e meia começou com um pedido de desculpas mútuas por suas atitudes anteriores diante das lutas das Mães da Praça de Maio, seguida por um reconhecimento das lutas conjuntas que os dois travavam em busca de justiça e acolhimento dos mais vulneráveis.
“Li com atenção e é admirável a trajetória que as Mães da Praça de Maio realizaram, insistentemente, durante estes 45 anos”, disse Francisco em carta. No mesmo ano, Bonafini escreveu: “querido papa Francisco, estou escrevendo para dizer o quanto precisamos de você. Estamos todos passando por um momento difícil. O país parece uma montanha que se desmorona como quando acontece um terremoto”, descreveu a argentina sobre a situação política, social e econômica do país.
Hebe de Bonafini também confessou que “tinha perdido completamente a fé antes da relação [com Francisco]”, e que essa reaproximação “restaurou a minha fé, tão necessária […]. Sem fé não se pode viver, e graças a essa fé falo todas as noites com os meus filhos”.
No ano de falecimento da ativista, em 2022, Francisco disse em homenagem à ativista que “sua audácia e coragem, nos momentos em que prevalecia o silêncio, mantinham viva a busca da verdade e da memória”.