Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida.
Simone de Beauvoir
A história das lutas das mulheres é a soma de uma trama de enfrentamentos cotidianos e anônimos e de lutas coletivas e individuais. Desde o golpe de 2016, aprofunda-se o desmonte das políticas sociais conquistadas, retração econômica, falência das instituições, opressão e preconceitos dirigidos às minorias, que representam sérias ameaças à democracia.
As mulheres seguem sendo as maiores vítimas. É alarmante o crescimento dos casos de violência contra a mulher. UMA MULHER MORTA A CADA DUAS HORAS! Chega! Todas as mortas e caladas pelos feminicídios estão presentes em nosso grito, às vezes preso na garganta.
Março é um momento propício, em que construímos o 8 de março para debater, cada vez mais organizadas, formas de acabar com as violências que o patriarcado e o Estado nos impõem.
O Ministério da Saúde confirmou que uma mulher é agredida a cada quatro minutos e, mesmo assim, o governo federal não destinou verbas e zerou, em 2019, os repasses que poderiam ser usados no enfrentamento e atendimento às mulheres em situação de violência de gênero no Brasil.
Nos últimos 15 anos, conquistamos a terceira Lei mais importante do mundo: Lei Maria da Penha. Ainda em fase de se consolidar e ser estruturada, quando começou a dar efeitos significativos, o Governo Federal desestrutura, aniquila, acaba com o processo. E, sucessivamente, o mesmo acontece na maioria dos estados e municípios.
As formas de violência que a população empobrecida, principalmente as mulheres, sofrem, vão além da violência de gênero. Não podemos ignorar que no Brasil grande parte da população urbana vive em locais precários, sendo a maioria mulheres negras que estão à frente desses lares.
Ainda são as mulheres que gastam horas substanciais de seu dia na arrumação da casa, no planejamento doméstico, em atividades de cuidado e acompanhamento de filhos/as, companheiros e pessoas idosas ou enfermas. Trabalho invisibilizado e não pago.
Outro elemento que diz respeito à vida das mulheres é que, em nosso país, a maior parte dos alimentos é envenenada, a soberania e saberes dos povos tradicionais são aniquilados, não há mais justiça ecológica e se aprofunda a ideologia da separação entre homens, mulheres e natureza. Diante disso precisamos resistir e reafirmar que nossa luta é indissociável da perspectiva ecológica do Bem Viver.
Em meio à crise e diante de um cenário que gera pouca certeza de garantia de direitos, a ordem do dia é RESISTIR. Cabe às lideranças e às organizações populares comprometidas, alertar e instrumentalizar para a luta.
As mulheres com sua energia, conhecimento e criatividade, a partir da organização e ações coletivas, vão ocupando espaços e produzindo elementos e ferramentas para resistir e avançar na manutenção e conquista de direitos.
Um dos desafios é construir convergências, alianças e unidade na luta pela emancipação das mulheres e da classe trabalhadora, capaz de denunciar os retrocessos do momento e anunciar possibilidades que nos deem esperança de seguir resistindo e caminhando.
As formas de organizar e resistir são as mais diversas e precisam ser criativas e alegres. Precisamos, coletivamente, transformar a dor das perdas de direitos, das ofensas e da vida em sementes férteis, que produzam frutos que alimentem de forma substancial a certeza de que é possível alcançar dias melhores.
Um exemplo disso é o caso da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), uma defensora dos direitos humanos e da vida das mulheres que foi agredida de forma absurda pelo atual presidente da República.
A agressão foi punida com um valor por “danos morais”. Esse valor não diminui o sofrimento, mas foi transformado numa ação que foi chamada de “Por Todas nós”, e tornou-se um lindo projeto de encorajamento a todas as mulheres que sofrem violência, para que não se calem.
É fundamental que nossas iniciativas apresentem o “inédito viável”, despertem a crença na possibilidade de viver, mais do que apenas sobreviver. Nossas causas precisam ser apaixonantes, despertar desejo de mudança e alegria de dividir e experimentar a solidariedade de classe.
As mulheres sempre precisaram lutar para defender suas vidas e para serem tratadas como seres de direitos. E mais do que nunca essa luta é necessária e justa. Sigamos de mãos dadas e cabeça erguida rumo à realização do sonho comum de justiça social e direitos iguais.