O homem acusado de matar a facadas Oziel Branques dos Santos dentro de um ônibus em Curitiba, no dia 16 de junho, também é o principal suspeito de assassinar Mateus Leonardo Adão, uma pessoa em situação de rua, cerca de 30 minutos antes.
Mateus foi encontrado gravemente ferido na Praça Rui Barbosa, na região central da cidade. Ele chegou a ser socorrido e levado ao hospital pelo Corpo de Bombeiros, mas não resistiu aos ferimentos.
“A equipe se deslocou até o local e se deparou com a vítima toda ensanguentada e desacordada no chão. Tinha muitas marcas de facada nas costas, no peito e braços”, disse o soldado Bazzani à redação da Banda B.
Os acusados pelo crime são Vagner do Prado e seu sobrinho. Mateus teria sido atacado após questionar sobre uma terceira morte que ocorreu 10 dias antes. Vagner é acusado de ter tirado a vida da sua ex-companheira durante uma discussão, ele estava com pedido de prisão preventiva em andamento e utilizava tornozeleira eletrônica.
Ambos os acusados teriam assassinado ainda Oziel Branques dos Santos, de 40 anos, em um ônibus biarticulado da linha Santa Cândida/Capão Raso. As mortes ocorreram com minutos de diferença.
Oziel ficou conhecido como herói por defender um casal de ataques homofóbicos e, por isso, ser brutalmente esfaqueado e morto. A memória é um direito fundamental de toda pessoa humana, movimentos de defesa das pessoas em situação de rua reivindicam também a honra e memória de Mateus.
Em postagem nas redes sociais, o Movimento Nacional da População de Rua do Paraná (MNPR) escreveu: “Esse apagamento da morte e da história de Mateus pode ser interpretado como a ausência de direito à memória que a população em situação de rua enfrenta historicamente. Tratando-se de pessoas em situação de rua, não importa como e porquê morreram, mas sim que era um corpo indesejado e, portanto, pode ser eliminado”.
Quem era Mateus
Mateus Leonardo tinha 24 anos e estava em situação de rua. Ele estava empregado e era pai de um recém-nascido de apenas nove dias. Motivados pelo emprego e o novo integrante da família, ele e a companheira estavam prestes a sair das ruas.
“Ele era uma pessoa muito querida pelos colegas e conhecidos, tinha arrumado um emprego e ia sair da rua ao lado da sua mulher. Infelizmente acabou morrendo desta forma”, conta Leonildo José Monteiro Filho, coordenador do MNPR.
Leonildo relata que, de acordo com testemunhas que acompanharam a discussão, Mateus teria ficado revoltado com o feminicídio e se aproximou de Vagner para questionar a motivação do assassinato. “Foram duas mortes cometidas por Vagner, mas enquanto eram pessoas em situação de rua ninguém se importou”, diz Leonildo.
“Sentimos que as pessoas não são lembradas por ninguém, apenas em episódios que envolvem alguém que não está nas ruas”, completa.
Vagner do Prado foi preso em flagrante pela morte de Oziel Branques dos Santos e acusado pela morte de sua ex-companheira e Mateus Leonardo. Ele também foi denunciado por corrupção de menor, uma vez que o sobrinho adolescente foi coautor do crime.
Violência contra a população da rua
Uma das atuações do MNPR se dá através do Centro Estadual de Defesa dos Direitos Humanos da Pessoa em Situação de Rua. Eles possuem uma equipe para atender, ouvir e acolher as pessoas que necessitam de algum suporte ou foram vítimas de violências.
Leonildo conta que, muitas vezes, o próprio agente de segurança pública se recusa a atender às solicitações da pessoa em situação de rua, por isso o centro tem se tornado referência para esse tipo de atendimento.
Além disso, a equipe está realizando um levantamento da violência e dos homicídios contra pessoas em situação de rua e pretende entregar esse material para as autoridades do estado do Paraná.
“Queremos que as pessoas entendam de uma vez por todas que a população em situação de rua também é gente e precisam ter o mesmo tratamento quando sofrem algum tipo de violência”.
Leonildo ressalta que em Curitiba pelo menos uma pessoa em situação de rua é assassinada por semana, de acordo com os atendimentos realizados pelo MNPR.
“Apenas nos últimos meses registramos a morte de uma pessoa enforcada na rodoviária de Curitiba, por um agente privado, e outra assassinada por um guarda dentro de um Centro de Proteção Social Especial de Média Complexidade, conhecido como Centro POP”, conta.
“Pedimos os dados sobre onde a população de rua é vítima de violência para realizarmos um mapeamento, mas eles não têm nada, a única parte onde conseguimos alguns dados é na Secretaria Estadual de Saúde. Mas quando se trata de segurança não há nada”, afirma Leonildo.
Por isso, o movimento ressalta a importância da criação de uma campanha contra a violência que a pessoa em situação de rua está exposta todos os dias e acaba sendo invisível para aqueles que deveriam proteger e cuidar.