No marco da campanha Despejo Zero, no dia 9 de agosto (sexta), as áreas de ocupação convocam o órgão de mediação do governo do Paraná (Sudis), o Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública, entre outros órgãos, para ouvir a demanda das comunidades por moradia, regularização fundiária e contra qualquer forma de despejo.
A Vila União, no bairro Tatuquara, surgida em maio de 2021, será a primeira comunidade a receber essa experiência, que tem sido usada também por movimentos sociais do campo.
A avaliação comum dos seis movimentos sociais (veja abaixo), organizações e comunidades que compõem a Campanha Despejo Zero no Paraná é de que a mais recente mesa de negociação, no dia 20 de junho – foram nove audiências ao todo desde 2022 – foi esvaziada na sua representatividade e teve pouco peso, tanto da parte da mediação do governo Ratinho Jr, como por parte do Judiciário, o que eleva o risco de despejo nas áreas.
Além disso, o primeiro semestre de 2024 foi marcado por despejos forçados em algumas situações: de oito famílias da rua Olga de Araújo Espíndola, no Novo Mundo; da ocupação Resistência Forte, no bairro Campo Comprido, com 200 famílias; das 60 famílias da ocupação Tiradentes II, no CIC, com recebimento mais tarde de auxílio-aluguel; e das mulheres da ocupação de prédio no centro, chamada Rose Nunes; além da ocupação Paulo Freire, em Paiçandú, interior do estado.
Parlamentares da base do governo Ratinho Jr também apresentaram Projetos de Lei com o mesmo teor do nacional (709/2023), que busca punir moradores de ocupações, prevendo desde punições criminais até a retirada de benefícios sociais, caso do programa bolsa-família.
Para a advogada e integrante da Frente de Organização dos Trabalhadores (FORT), Bárbara Esteche, são preocupantes as ações do Estado no primeiro semestre, que buscaram criminalizar as ocupações no seu cotidiano, com perseguição de lideranças, o que está na essência dos atuais projetos de lei:
“Assim, o terreno da opinião pública está preparado quando leis persecutórias, como as que estão em fase de projeto no estado do Paraná, são apresentadas. Ainda que as leis, especificamente, estejam formalmente no projeto, na prática, já está acontecendo uma perseguição bem próxima do que está escrito (…) Audiências acontecendo na própria comunidade trazem visibilidade e propiciam o contato direto, permitindo o conhecimento da realidade, além de desenvolver o local.
A ideia, portanto, é trazer para a comunidade essas questões e, por outro lado, dar visibilidade para as questões das comunidades. Cláudio D´Ávila, mais conhecido como o “Claudião do Povo”, afirma que a ideia é fazer o convencimento de que os trabalhadores que residem na Vila União estão com suas famílias enraizadas e precisam viver no lugar.
“Ninguém quer sair do terreno onde está porque temos colégio, creche aqui pertinho, posto de saúde, terminal perto, é um lugar top para a turma ficar aqui, então a intenção é morar mesmo, é muito importante as autoridades olharem a situação como era e como está hoje”, afirma. Ele mesmo, pai de três crianças, vive ao lado da companheira, Rosa, e está na vila desde o primeiro dia.
“Nós, da Vila União, somos em 200 famílias. Nossa comunidade está conformada no Tatuquara desde maio de 2021. Hoje, nos organizamos a partir da Frente de Organização dos Trabalhadores (FORT), com apoio dos Redentoristas e das Irmãs Vicentinas. Contamos com cozinha comunitária, centro cultural, reforço escolar, educação de jovens e adultos, entre outras ações”, afirma panfleto da comunidade, reforçando os espaços organizativos da comunidade.
Campanha Despejo Zero é das grandes experiências organizativas desde o período da pandemia, no Paraná / Juliana Barbosa
Possibilidade organizativa
Roberto Baggio, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e integrante da Campanha Despejo Zero vê na atual conjuntura a campanha como aglutinadora da luta por moradia. E a experiência da assembleia popular como momento de integração da comunidade e aprendizado com a negociação.
“Essa iniciativa de mobilizar, articular solidariedade, fazer pressão constituiu-se neste tempo um jeito de organizar um trabalho popular permanente a partir de cada comunidade, e agora vamos dar um passo organizando as assembleias populares, no dia 9 de agosto na Vila União, como um dia de preparação da comunidade. Autoridades do município da comunidade vão conhecer sua vida, seu jeito, iniciativas de renda, para a partir disso ser um momento de apresentar um jeito de resolver o impasse, regularizando a área para as famílias”, aponta.
A avaliação nas áreas de ocupação é a necessidade objetiva de as áreas de ocupação se manterem, sobretudo neste ano eleitoral, na medida em que já estão instaladas e garantem à população mais pobre, uma vez que não precisam pagar aluguel, além de terem acesso a espaços que contribuem na sua manutenção de vida, caso das cozinhas comunitárias.
“Esse modelo de trazer as autoridades para a região do conflito vai ajudá-los a ter uma ideia mais concreta da situação em que as pessoas vivem, o que vai ajudar muito na mediação do conflito. Muitas vezes, a única possibilidade é viver em regiões de ocupação”, afirma o padre redentorista Joaquim Parron, animador e figura presente nas áreas de ocupação de Curitiba e Região.
Já Professor Ricardo, coordenador do Movimento Popular por Moradia (MPM), reforça que o espaço fala na verdade da situação de todas as comunidades em risco de Curitiba e região.
"Nós, do Movimento Popular por Moradia, enxergamos na Despejo Zero um símbolo de unidade e de solidariedade entre movimentos sociais, mandatos parlamentares, comunidades periféricas e organizações não governamentais. É uma união necessária e urgente para lutar pelo elementar direito à moradia. Como é característica da vida política, a Despejo Zero é feita de avanços e revezes, mas o saldo é positivo e a solidariedade nutre nossas esperanças de uma vida mais digna para todos e todas", diz.
“Nós, da Vila União, somos em 200 famílias. Nossa comunidade está conformada no Tatuquara desde maio de 2021 / Francine Alvarenga
Movimentos sociais que integram a campanha Despejo Zero no Paraná
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
Movimento Popular por Moradia (MPM),
Frente de Organização dos Trabalhadores (FORT),
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)
Movimento dos Trabalhadores por Direitos (MTD)
União Nacional de Moradia Popular (UNMP)
Muitas vezes, a única possibilidade é viver em regiões de ocupação”, afirma o padre redentorista Joaquim Parron, animador e figura presente nas áreas de ocupação de Curitiba e Região / Pedro Carrano