Ouça a Rádio BdF

Bilhões gerados pela reciclagem no Brasil devem ir para as mãos dos catadores, diz presidente da Fundação BB

Kleytton Morais é o convidado desta semana no BdF Entrevista, gravado na 11ª Expocatadores, em São Paulo

A reciclagem de materiais como plástico e alumínio movimenta bilhões de reais no Brasil e pouco desse valor é compartilhado com os verdadeiros agentes desse processo, que são os catadores e as catadoras de recicláveis. 

Entre os dias 18 e 20 de dezembro, a cidade de São Paulo recebeu a 11ª edição da Expocatadores. O evento aproximou catadores, empresas e apoiadores da reciclagem do Brasil para troca de experiências e novas oportunidades de negócio.

A Fundação Banco do Brasil é uma destas parceiras na reciclagem realizada no Brasil. Durante o evento, a instituição anunciou o resultado de um edital que, em parceria com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), destinará R$ 50 milhões de recursos para cooperativas e associações de catadores.

Segundo o presidente da Fundação Banco do Brasil, Kleytton Morais, o “Cataforte”, como é chamado o edital, fortalecerá “o processo de coleta, separação e seleção dos materiais para ter valor agregado”. A ideia, para Morais, é que “os bilhões da reciclagem fiquem cada vez mais com os catadores, para que haja um processamento, uma agregação de valor”.

“Ao invés da latinha avulsa ser prensada, pensar a transformação da lâmina de alumínio para entregar para a indústria. Então, você agrega valor nessa perspectiva, elevando a renda dos catadores e das catadoras. Acho que esse é o desafio de um novo modelo de negócios em que os catadores e as catadoras são centrais no processo de inclusão”, completa Morais. 

O presidente da Fundação Banco do Brasil é o entrevistado desta semana no BdF Entrevista. Na conversa, Morais explica que a reciclagem no Brasil tem um “desenho específico, inédito, que pode ser uma contribuição para todo mundo no processo de economia circular”.

“[O nosso modelo da reciclagem] pode salvaguardar os recursos naturais”, comenta Morais. “A experiência da reciclagem no Brasil é de inclusão socioprodutiva dos catadores, o que eles entregam do ponto de vista de ganho para o meio ambiente, para a sociedade, para a vida no planeta e obviamente também para a própria noção de economia das empresas”, completa o presidente da Fundação BB. 

Abaixo, confira alguns trechos da entrevista (no vídeo acima, você pode conferir a entrevista na íntegra): 

Brasil de Fato: A gente está aqui no Pavilhão de Exposições do Anhembi, aqui em São Paulo, para a 11ª Expocatadores. Esse evento é muito importante, principalmente para valorizar essas pessoas, que fazem esse trabalho tão importante de reciclagem no Brasil. 

Kleytton Morais: Com certeza. A Expocatadores virou um evento de proporções internacionais, inclusive. Então, se pensa a reciclagem a partir dos seus agentes, os recicladores do Brasil, que são os catadores e as catadoras, organizados em associações cooperativas, e catadores autônomos, que ainda não estão organizados na dimensão de associações e cooperativas.

E o evento envolve o setor de forma geral, os grandes geradores, as empresas, envolve a indústria também no processo de inclusão socioprodutiva dos catadores, envolve o Estado, a partir dos agentes públicos federais, dialogando na perspectiva também das esferas administrativas de município e do estado também, porque a política nacional envolve esses agentes.

E a sociedade civil de forma geral. Os investidores, que são as estatais, aqui no caso a Fundação Banco do Brasil e vários outros parceiros, atores que têm compromisso com essa pauta dos catadores e das catadoras.

As empresas são as responsáveis pela geração de resíduos. A gente vê muita propaganda nas embalagens, tem lá o uso reciclável, o uso consciente, mas é importante que eles acompanhem de perto esse processo da reciclagem, ver quem são os catadores, quem são as pessoas que estão lá na ponta fazendo esse serviço, não é? 

A ideia da Expocatadores, o embrião, é do presidente Lula. Tudo começa com essa sensibilidade, essa percepção e o compromisso do presidente, que tomou a decisão de se reunir com os catadores para celebrar o “Natal dos Catadores”, embaixo do viaduto, em São Paulo. Então, a Expocatadores acaba adensando isso. É um momento de entregas, mas é um momento também de intensificação da agenda. 

No Brasil, a gente tem grandes desafios do ponto de vista das implementações dos planos de logística reversa, do fechamento dos lixões, por exemplo, do processo de humanização dessas relações, que envolve o tratamento de resíduos no Brasil. Em que pese as normativas, mas os processos de implementação da política, pelos processos de descontinuidade no nosso país, ainda está muito aquém de um horizonte, vamos dizer, tido como ideal. 

A perspectiva de dialogar com as empresas e de salvaguardar essa responsabilidade socioambiental das empresas, ela é fundamental, e a gente observa avanços nesse período curto, inclusive quando a gente tem, nesse fórum, a participação dessas empresas públicas e privadas.

Aqui no Brasil a gente tem um desenho específico, inédito, que pode ser uma contribuição para todo mundo no processo de economia circular e salvaguardar os recursos naturais, para ressaltar essa experiência da reciclagem no Brasil, da fortaleza, da retumbância que é a inclusão socioprodutiva dos catadores, o que eles entregam do ponto de vista de ganho para o meio ambiente, para a sociedade, para a vida no planeta e obviamente também para a própria noção de economia das empresas. Para quem está nos assistindo entender, os catadores são responsáveis, no Brasil, pela reciclagem de 98% do alumínio, das latinhas de cerveja, de refrigerantes, de suco, enfim.

Aproveitando o teu gancho, os catadores têm um papel central na economia brasileira, e as pessoas não se dão conta disso… 

É fundamental, quando a gente pensa os processos de agregação de valor de uma economia, os catadores e as catadoras contribuem determinantemente. Contribuem do ponto de vista do valor agregado aos processos e contribuem também para uma outra perspectiva, que é um outro modelo econômico, de consumo, baseado na ideia de que os recursos são finitos, precisa ter uma sustentabilidade no uso, vamos dizer, da biodiversidade, da natureza. 

E não é apenas o uso, acho que é uma convivência harmoniosa com esse processo. Então, a implementação do ciclo de reciclagem, de reuso, de educação ambiental, os catadores e as catadoras no Brasil fazem isso e precisam, a partir do momento em que você tem coletas seletivas implementadas, você tem a porta de entrada para o respeito a essa categoria.

E respeitar significa vencer os preconceitos, que é fundamental, mas além disso, valorizar do ponto de vista do pagamento dos serviços ambientais que essa categoria presta para o país e para o mundo, porque a crise climática é também determinante nos processos de saúde, porque os lixões contaminam e assoreiam os cursos de água, lençóis freáticos, enfim. 

Então, qual é o custo disso? Como é que a gente pode trazer isso para a economia? Porque são impactos na economia, na vida, na organização da sociedade. Por isso, é urgente o reconhecimento dos catadores e catadoras, quer seja do Estado, quer seja das empresas, dos grandes produtores de resíduos do nosso Brasil. 

Você falava sobre a quantidade de alumínio coletado pelos catadores – mais de 90 % das latas – é um montante gigantesco. A gente tem a estimativa de quanto os catadores movimentam na economia com a reciclagem? 

Em termos de montante, o valor passa de bilhões, mas eles não ficam com os catadores, acho que esse é um aspecto super importante e que está sendo tratado do ponto de vista das políticas, inclusive. No dia 19 de dezembro, a Fundação Banco do Brasil e o BNDES anunciaram o resultado de um edital que fortalece as redes de catadores e catadoras em todo o país.

O edital “Cataforte” disponibilizará R$ 50 milhões para fortalecer essas redes de cooperativas e associações. E o que é esse fortalecimento? É justamente o processo de coleta, separação e seleção dos materiais ter valor agregado, para que, de novo,
os bilhões da reciclagem, fiquem cada vez mais com os catadores, para que haja um processamento, uma agregação de valor.

Ao invés da latinha avulsa ser prensada, pensar a transformação da lâmina de alumínio para entregar para a indústria. Então, você agrega valor nessa perspectiva, elevando a renda dos catadores e das catadoras. Acho que esse é o desafio de um novo modelo de negócios que os catadores e as catadoras são centrais no processo de inclusão. 

Estamos falando de modelos, por exemplo, de alteração de matriz energética. E como é que os catadores e as catadoras podem contribuir nesse desafio? Que podem, eles já mostraram que têm condições, tem toda uma capilaridade nacional pelo próprio
processo histórico brasileiro. A gente tem hoje entre 800 mil e 1 milhão de pessoas que vivem do processo de reciclagem no país.

Veja mais