A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros 33 aliados seus envolvidos em crimes contra a democracia repercutiu entre lideranças do Congresso Nacional logo após a notícia ter vindo à tona.
Órgão do Ministério Público Federal (MPF), a PGR denunciou o grupo pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de direito e organização criminosa por conta dos fatos políticos ligados à tentativa de impedir o presidente Lula (PT) de assumir o terceiro mandato. A iniciativa da PGR se baseia em inquérito produzido pela Polícia Federal (PF). Em novembro de 2024, o órgão indiciou o ex-capitão após investigações concluírem que ele participou ativamente da trama golpista.
A partir da denúncia, houve grande repercussão nas redes sociais. “Parece que o ‘capitão’ e sua tropa terão que enfrentar a Justiça. A democracia prevalece”, disse a líder da bancada do Psol na Câmara dos Deputados, Talíria Petrone (Psol-RJ).
Em outra postagem, a parlamentar elencou o rol de condutas listadas pela PGR para incriminar o ex-presidente. “Vamos aos crimes de Bolsonaro que constam na denúncia enviada pela PGR ao STF: liderança de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado. Além disso, a PGR afirmou que Bolsonaro foi o líder da organização que tentou derrubar a democracia no Brasil”. A psolista também debochou da situação do ex-capitão, afirmando que ele está “totalmente denunciado”, em referência à expressão que virou meme na internet.
O líder da bancada do PSB na Câmara, Pedro Campos (PE), também reagiu à iniciativa do MPF. “Bolsonaro e sua turma estão colhendo o que plantaram: conspiração, golpe e caos. A PGR denunciou 34 envolvidos na trama golpista – organização criminosa armada, golpe de Estado, ameaça à democracia. O nome disso é crime. Que a Justiça vença”, disse o pessebista por meio de sua conta no “X”, antigo Twitter.
Ao compartilhar uma publicação que noticiava a denúncia, o deputado Orlando Silva (PcdoB-SP) afirmou que “Bolsonaro não vai pegar 43 anos [de cadeia], mas é certo que, se condenado, mesmo nas penas mínimas de cada crime, vai para o regime fechado”. “Então, após o fim do julgamento, o ‘Uh, vai ser preso’ deve virar realidade”, emendou o parlamentar.
O deputado Chico Alencar realçou que a denúncia chega “773 dias depois do ataque criminoso aos três Poderes no 8 de janeiro” e constitui um “documento que cutuca toda a cidadania brasileira”. “Significa um repúdio àqueles que se posicionam desprezando a democracia, os valores republicanos e que defendem o golpismo. Aliás, são os mesmos que também não têm objeções àquela página infeliz da nossa história, derivada do golpe empresarial militar de 1964, coonestando, assim, censura, tortura, ditadura. Diante disso, a nação brasileira está chamada a se posicionar: é democracia ou autoritarismo; justiça, inclusive a social, ou negacionismo”, disse ao Brasil de Fato.
Senadores
A novidade também gerou ecos no Senado. “Bolsonaro e seus aliados tentaram tudo para se manter no poder após serem derrotados nas urnas pelo presidente Lula em 2022, mas a Justiça está agindo. A denúncia da PGR, apresentada pelo procurador-geral, Paulo Gonet, será analisada pela primeira turma do STF, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes. Esse é um marco na luta pela verdade e pela democracia. O Brasil precisa virar essa página de ataques institucionais e fortalecer o Estado de direito. Quem tentou destruir a democracia deve pagar pelos seus crimes”, reagiu o senador Rogério Carvalho (PT-SE) por meio de sua conta no “X”.
Já o senador Fabiano Contarato (PT-ES) destacou que a denúncia “é robusta e traz Bolsonaro como o líder de uma organização criminosa que atentou violentamente contra a nossa democracia e a nossa Constituição.” “Não se espantem se passarem a ouvir gritos desesperados ainda mais altos por anistia. É que Justiça se faz com base em provas, e eles sabem muito bem que o peso dos fatos está contra eles”, continuou o petista.
Líder do governo no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que “tarda, mas não falha”, em referência às movimentações do sistema de Justiça em torno do ex-presidente.
Ministério da Defesa
Na lista de denunciados mirados pela PGR junto ao STF figuram 24 agentes das Forças Armadas, entre eles os ex-ministros de Bolsonaro Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio, todos eles do generalato. Somente a Força Aérea Brasileira (FAB) não tem nomes comprometidos na denúncia. A iniciativa do MPF provocou manifestação também do Ministério da Defesa. Em nota oficial divulgada à imprensa, a pasta disse que a denúncia “é importante para distinguir as condutas individuais e a das Forças Armadas”. “A avaliação do ministro José Múcio Monteiro é de que a apresentação da denúncia é mais um passo para se buscar a responsabilização correta, livrando as instituições militares de suspeições equivocadas”, acrescenta o documento.
Outro lado
Nesta quarta-feira (19), a defesa de Bolsonaro classificou a denúncia como “incoerente” e afirmou que o ex-presidente “jamais compactuou com qualquer movimento que visasse à desconstrução do Estado Democrático de Direito ou das instituições que o sustentam”.
Na mesma linha, a defesa do general Braga Netto chamou a denúncia de “fantasiosa”. No texto, os advogados José Luis Oliveira Lima e Rodrigo Dall’Acqua afirmam que a PF e o MPF ignoraram o pedido do general para prestar esclarecimentos, demonstrando “desprezo por uma apuração criteriosa e imparcial”. “É inadmissível numa democracia, no Estado democrático de Direito, tantas violações ao direito de defesa serem feitas de maneira escancarada”, diz a nota. Em nota, a defesa do general Braga Netto chamou a denúncia de “fantasiosa”.
Já Filipe Martins, ex-assessor especial para Assuntos Internacionais de Jair Bolsonaro e considerado parte do núcleo jurídico de articulação do golpe, afirmou por meio de nota publicada pela defesa que “repudia veementemente a condução suspeita desse processo, a manipulação realizada durante as investigações e as acusações infundadas do PGR. E demonstrará, junto ao seu cliente, não apenas que tudo é falso, mas também que tudo é nulo desde o princípio”. Martins foi preso em 2024 por seis meses e solto após provar que não deixou o Brasil no final de 2022.
Em entrevista à CNN, o senador Flávio Bolsonaro (PL), filho do ex-presidente, disse que a PGR se baseia “em um rascunho de projeto de Estado de Sítio, que seria enviado, supostamente, ao Congresso Nacional, algo que ninguém sabe quem foi que escreveu”.