Organizações de saúde e parlamentares do Distrito Federal manifestaram, nesta quinta-feira (20), preocupação com a demissão da secretária de Saúde, Lucilene Florêncio, e o anúncio de que Juracy Cavalcante, atual presidente do Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do Distrito Federal (Iges-DF), deve assumir a Secretaria de Saúde do DF (SES). Segundo as organizações, a indicação demonstra o interesse do Governo do Distrito Federal em entregar a saúde à iniciativa privada.
“Como Juracy vem do Iges, a gente avalia que essa nomeação cumpre o papel de ampliar essas terceirizações no momento de crise sanitária de saúde aqui do Distrito Federal”, disse o presidente do Sindicato dos Enfermeiros do DF, Jorge Henrique.
Ele também destaca que o anúncio gera “muita estranheza”, ao lembrar que o Instituto está na mira do Ministério Público do DF e Território (MPDFT) por corrupção envolvendo o contrato de fornecimento de alimentação à pacientes. Em 2024, as investigações do MPDFT encontraram indícios de que os gestores favoreciam de forma indevida a empresa Salutar, apesar do não cumprimento de cláusulas, por exemplo, em relação aos tipos de alimentos servidos e da baixa qualidade geral das refeições oferecidas aos pacientes.
A demissão da secretária Lucilene Florêncio foi confirmada na manhã desta quinta durante reunião com o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), que em seguida fez o anúncio do novo secretário e do diretor-presidente do IgesDF, vaga que será ocupada por Cleber Monteiro, que era o diretor vice-presidente da instituição.
Para o Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF) a mudança reforça a política do GDF de avançar com a terceirização e privatização dos serviços de saúde, e aponta prejuízo dos profissionais da área e da população que depende do SUS. “A falta de autonomia da antiga secretária para conduzir ações essenciais da pasta já era evidente, especialmente no que diz respeito à recomposição salarial dos servidores da saúde”, mostra nota da entidade.
Para a presidente da Associação Brasileira de Enfermagem – Secção Distrito Federal, Karine Fonseca, a notícia da substituição foi recebida “com muita preocupação”, uma vez que, segundo ela, o presidente do Iges, nesses últimos anos, demonstrou uma ineficiência para gerir recursos abundantes. “Hoje, o recurso do Iges para gerir dois hospitais e as UPAs [Unidade de Pronto Atendimento], está em torno de R$ 1 bilhão e 200 mil. Esses valores não foram suficientes, para dar uma assistência adequada e preservar serviços de referência dentro do hospital de base e do hospital de Santa Maria”, explica Karine, que é conselheira distrital de Saúde.
“Nos espanta a escolha do governador, justamente, por um gestor que se mostra tão ineficiente em administrar um recurso abundante, com diversas facilidades jurídicas e governamentais. Mas sabemos o motivo da escolha de Juracy, já que ele é um empresário da saúde, sócio de cinco empresas, e construiu sua carreira médica no setor empresarial, sem trajetória dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). Essa decisão representa mais um passo do governador rumo à privatização do SUS, entregando um bem público aos interesses lucrativos da iniciativa privada”, destaca Karina.
CPI da Saúde
Presidente da Comissão de Saúde da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), a deputada Dayse Amarílio (PSB-DF) observa que uma possível privatização na Saúde preocupa, uma vez que já foi observado que a medida não apresenta solução para o DF. “Estamos vigilantes e solicitamos uma reunião com a Secretaria para fortalecer o SUS e reorganizar os serviços, garantindo que interesses políticos não comprometam essa área essencial. Apesar da gravidade da situação, acreditamos que há solução, e a Câmara Legislativa seguirá fiscalizando e atuando para melhorar a saúde no DF”.
Para o deputado distrital Max Maciel (Psol-DF) é fundamental que a Câmara Legislativa do DF instaure a CPI da Saúde. “Vamos reunir todos os gestores, analisar contratos e apurar os fatos, pois estamos falando de um orçamento de 14 bilhões de reais, enquanto a população continua sem atendimento adequado na atenção primária, secundária e em toda a complexidade da saúde.”
Na avaliação do deputado distrital Gabriel Magno (PT-DF) a indicação do novo Secretário de Saúde é muito grave, pois “reforça o que o governo já tem feito ao destituir o comando único do SUS e avançar a terceirização e na privatização”.
“Isso coloca o governo como um dos grandes responsáveis pelo caos da saúde no DF. O Iges não presta conta, não tem controle social, não consegue atender a população na ponta, e agora vai assumir o comando da Secretaria de Saúde. Temos uma CPI na Câmara para discutir, inclusive, investigar as várias denúncias do Iges”, aponta.
O vice-presidente da CLDF, Ricardo Vale (PT-DF) disse que espera que a mudança traga melhorias reais para a saúde no DF, porque, segundo o distrital, a população “não aguenta mais”. “O fato é que o DF também está cansado de uma gestão ineficiente na saúde. Nos últimos anos, enfrentamos a falta de médicos e insumos, hospitais superlotados, déficit de servidores e sucessivas crises no Iges. É urgente que essa troca resulte em avanços concretos, porque a população não suporta mais esse descaso.”
“As recorrentes trocas no comando da secretaria são um grave sintoma da péssima gestão do governo Ibaneis. Esta é a quinta troca no comando da pasta em mais de seis anos de governo. Nos preocupa muito que o atual presidente do Iges seja o nome escolhido para substituir a ex-secretária. A população sente na pele como a precarização dos serviços se intensificou com a criação e ampliação do Iges, que está mergulhado em escândalos de corrupção”, observou o deputado distrital Fábio Felix (Psol-DF).
O Brasil de Fato DF procurou a Secretaria de Saúde, mas a pasta não se posicionou sobre as críticas até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestação.
Comitê de Saúde
A demissão de Lucilene Florêncio ocorreu logo após um decreto de intervenção de outra pasta na área, com a criação do Comitê Gestor de Saúde do Distrito Federal. “Defendemos que a Secretaria tenha autonomia, livre de interferência política, e maior liberdade orçamentária para melhorar as condições de trabalho dos servidores”, pontua a deputada Dayse Amarílio.
A criação do Comitê foi anunciada, via decreto, em 7 de fevereiro, e determinava que o novo órgão seria vinculado à Secretaria de Economia do DF (SEEC-DF) e teria como presidente o secretário Ney Ferraz, responsável por indicar os membros titulares e executivos.
Após uma série de críticas ao Comitê Gestor de Saúde do Distrito Federal, o governo Ibaneis publicou no dia 12 de fevereiro, um novo decreto alterando toda a estrutura do Comitê, que passou a ser vinculado à Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.
:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::