Tomou posse neste sábado (1º) o novo presidente do Uruguai, Yamandú Orsi, que vai governar o país pelos próximos cinco anos. A cerimônia aconteceu na sede do Legislativo uruguaio e contou com a presença de mais de 60 delegações estrangeiras, entre elas, uma comitiva brasileira, liderada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que chegou a Montevidéu na noite de sexta-feira (28).
Após ser juramentado, em seu primeiro discurso como chefe do Executivo uruguaio, Orsi prestou homenagem aos ex-presidentes Tabaré Vásquez, já falecido, e José Pepe Mujica, que compareceu à cerimônia ao lado de sua esposa, a ex-senadora Lucía Topolansky . “Chego com os ensinamentos de Tabaré Vásquez e José Mujica”, disse o presidente, interrompido por longa salva de palmas.
O novo presidente destacou os 40 anos ininterruptos de processo democrático e alternância de poder, desde 1985, depois de 13 anos de ditadura militar. “A alternância no poder é um sinal de um país em que a confiança continua a ser um elemento central para o seu funcionamento. E o Uruguai funciona”, destacou.
“Afastemo-nos o mais possível do cinismo e da frivolidade para não ter que lamentar a descrença na política e suas consequências. Pessoalmente, rebelo-me contra este suposto país de duas metades”, disse Orsi. “Saibam que eu nunca me dei bem com os muros, nem com os ideológicos”, completou.
No entanto, o novo presidente uruguaio defendeu o processamento de casos de desaparecidos políticos durante o período militar. “A democracia desfrutará de melhor saúde no dia em que todas as famílias uruguaias souberem onde estão seus parentes desaparecidos”, disse o mandatário, que defendeu ainda um maior crescimento econômico, mais investimento em produção de conhecimento e qualidade do trabalho, além de salário digno e distribuição de renda.
Mudanças climáticas
Orsi reservou parte de seu discurso para o tema das mudanças climáticas e seus efeitos sobre a população, sobretudo os mais vulneráveis. “As evidentes alterações climáticas nos alertam que devemos formular estratégias de desenvolvimento, uma abordagem sustentável e humana, respeitando os limites da natureza e garantindo um futuro melhor para as gerações futuras. Para eventos climáticos extremos, é uma necessidade inevitável planejamento, investimento, comprometimento”, disse o presidente.
“Devemos reforçar as nossas infraestruturas e melhorar os sistemas de resposta e dar prioridade às políticas de mitigação e adaptação para proteger o nosso povo. No mesmo sentido, é imperativo avançar num Plano Nacional de Águas, para garantir o abastecimento da produção e a proteção dos nossos recursos mais valiosos. E desenvolver a irrigação como estratégia para agregar valor aos nossos”, destacou.
Integração sul-americana
Yamandú Orsi destacou a disposição de aprofundar os processos de integração e fortalecer os mecanismos de cooperação multilaterais.
“O andamento das ações e acordos do Mercosul, o fortalecimento da Celac [Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos], participação cada vez mais ativa na OEA [Organização de Estados Americanos], o aprofundamento da cooperação Sul-Sul, a multiplicação de acordos com os grandes países de referência do nosso mundo, numa base bilateral ou multilateral, serão algumas das bandeiras que levaremos nesses cinco anos”, disse o novo presidente Uruguaio.
“Uma das nossas principais responsabilidades é que esta região continue a ser um continente de paz, com maior estabilidade, equilíbrio social e económico que nos permita um melhor processo de integração”, completou.
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Segurança
O novo mandatário uruguaio abordou o tema da segurança como um dos principais desafios para a garantia dos direitos humanos da população, destacando que não haverá solução suficiente que não passe por atacar as raízes do problema.
“A segurança constitui um dos nossos direitos humanos fundamentais. Não haverá contemplação com o crime. Sabemos bem que a solução será insuficiente e até demagógica se não enfrentarmos de forma decisiva as múltiplas causas da violência.”
No mesmo sentido, Orsi fez um chamado à cooperação internacional para o enfrentamento ao crime organizado. “O nosso compromisso com a luta frontal contra o crime organizado, o tráfico de drogas e a lavagem de dinheiro permanece intacto e estamos convencidos de que um compromisso dessa magnitude só pode ser assumido com colaboração e cooperação entre países”, afirmou.
Qual liberdade?
Sem citar nomes, o presidente recém-empossado do Uruguai criticou o que chamou de “um conceito ultra individualista” de liberdade, sobre o qual há predominância da lei dos mais fortes. “Essa nunca será a nossa noção de liberdade”, destacou, questionando os limites da liberdade em um sistema desigual. “Quanta liberdade pode exercer ou desfrutar um compatriota que tem que fazer uma peregrinação semanal a um centro de saúde para obter os seus medicamentos? Quão livre é alguém que sofre de sérios problemas de moradia ou de trabalho? Quantas mulheres se sentem violadas nas ruas ou nas portas?”, questionou.
Impontualidade
A cerimônia de posse no parlamento uruguaio começou alguns minutos depois do previsto, mesmo com o presidente e vice-presidenta eleitos já no recinto. A imprensa do país atribuiu o ocorrido ao atraso do presidente Lula, que chegou poucos minutos antes da execução do hino nacional. Do lado de fora do palácio Legislativo, Lula foi saudado por cidadãos que acompanhavam a sessão do lado de fora.
Orsi e Lula já haviam se encontrado antes da cerimônia de posse, na noite de sexta (28), quando o presidente Lula ofereceu um jantar na embaixada brasileira em Montevidéu, que também contou com a presença dos presidentes do Chile, Gabriel Boric, e da Colômbia, Gustavo Petro.
Na manhã deste sábado, Lula se reuniu como presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, e recebeu a candidata presidencial do Equador, Luisa González, a pedido da equatoriana. Em nota, a Presidência da República informou que foram tratados temas de relevância no contexto político da América do Sul.
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“Expressamos nossa concordância na importância do fortalecimento da democracia e da justiça social no continente. Desejo que as eleições no segundo turno no Equador transcorram de forma pacífica e dentro da normalidade, e que a vontade do povo equatoriano prevaleça”, disse o comunicado.
O presidente Lula retorna a Brasília, por volta das 17h. Antes disso, ele vai se encontrar o ex-presidente uruguaio, José Pepe Mujica, de quem é amigo.
Relações comerciais
Brasil e Uruguai são parceiros importantes, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos, com fluxos comerciais elevados, com destaque para bens manufaturados. Em 2024, a corrente comercial foi de US$ 4,965 bilhões, segundo maior valor da série histórica. O Brasil teve superávit de US$ 450 milhões, resultado de US$ 2,7 bilhões de exportações e de US$ 2,25 bilhões de importações.
Além disso, o Brasil é fonte do quarto maior estoque de investimentos estrangeiros diretos no Uruguai, com participação de 10%, atrás de Espanha (17%), Finlândia (13%) e Argentina (13%). Os investimentos brasileiros somam U$ 4,52 bilhões.
Isso faz do pequeno país sul-americano, com pouco mais de 3 milhões de habitantes, um dos principais parceiros comerciais do Brasil. Além disso, os dois países compartilham mais de mil quilômetros de fronteira.