Ouça a Rádio BdF

Trunfo do governo Petro na Colômbia são as mobilizações populares, diz analista

Na liderança do primeiro governo de esquerda da história da Colômbia desde 2022, Gustavo Petro, presidente do país, enfrenta uma série de crises políticas. A mais recente delas envolve a região de Catatumbo, na fronteira com a Venezuela, onde há atuação da guerrilha Exército de Libertação Nacional (ELN).

Uma das promessas de campanha do atual presidente colombiano foi acabar com o conflito armado no país, que já dura mais de cinco décadas, e que surge com o nascimento de grupos armados nos anos 1950 e 60, muito inspirados pela luta cubana de libertação, além do surgimento de organizações voltadas ao tráfico de drogas e grupos paramilitares.

A Colômbia e os enfrentamentos políticos do governo de esquerda de Petro foram tema de O Estrangeiro desta semana, o podcast de política internacional do Brasil de Fato.

O corresponde do Brasil de Fato na Venezuela, Lorenzo Santiago, explica que a crise sobre a região de Catatumbo não é nova, e que vem ganhando um cenário de disputa territorial entre guerrilhas “por dois fatores principais: mineração ilegal e tráfico de drogas. E que, agora, esquentou uma disputa entre a ELN e a Frente33, uma dissidência da força das Farc”.

Santiago também ressalta que o governo Petro matinha conversas de cessar-fogo com a ELN desde o ano passado, mas que o estopim para a crise de violência no território “foi o ataque mútuo entre essas duas guerrilhas no final de janeiro. E o governo Petro, depois desses ataques, volta atrás e diz que tinha encerrado as negociações com a ELN”.

O confronto já deixou mais de 50 mortos apenas em Catatumbo, além de 50 mil pessoas que deixaram a região por conta da violência, “o que obrigou Petro a decretar estado de comoção social na Colômbia, o que seria algo parecido com uma intervenção federal no Brasil”, esclarece Lorenzo. Além disso, o correspondente também ressaltou a própria constituição única do exército colombiano, que possui foco em batalhas internas e que, no ano passado, teve o orçamento cortado em 25% por Petro.

O analista político Miguel Stedile pontuou o fato de somente agora a Colômbia ter tido o seu primeiro governo de esquerda: “O país não fez parte da onda de governos mais progressistas que a América do Sul teve no início do século, e muito por parte das influências de forças de direita e do governo dos EUA na Colômbia”.

Ele explicou que a Colômbia é um país conservador e as forças de direita estão presentes no governo há muito tempo, o que faz com que o próprio governo atual sofra uma grande resistência na aprovação dos projetos.

Lorenzo Santiago trouxe os parâmetros de aprovação da gestão Petro, com 41% da aprovação popular. “Não é muito grande, mas é mais do que o próprio governo Lula, por exemplo. Por isso, dá para perceber que existe uma esquerda que é minoritária no país, mas que apoia bastante o governo.”

O correspondente levantou uma ferramenta importante utilizada pelo presidente na luta contra as forças políticas contrárias: a mobilização popular. “Sempre que é atacado pela direita ou quando recebe uma acusação ou denúncia por parte do Ministério Público ou da Procuradoria Geral, ele convoca a população para ir à rua, e a população realmente abraça. Ele conseguiu organizar manifestações massivas em Bogotá e outras cidades de referência na Colômbia.”

Alianças e derretimento ministerial

Assim como muitas gestões políticas mundiais, Petro teve que fazer alianças com outros partidos e líderes políticos para viabilizar seu governo. No entanto, muitas dessas alianças com os liberais e social-democratas estão se desfzendo neste momento.

Há duas semanas, o presidente fez uma reunião ministerial televisionada que gerou uma crise interna muito grande, em paralelo com a crise em Catatumbo. Nesta reunião, Petro criticou duramente os ministros de seu governo, acusando-os de impedir o avanço de uma série de pautas populares e próprias de um governo de esquerda, e criticando a falta de compromisso. “Isso gerou uma renúncia generalizada, com quatro ministros deixando o cargo”, explica Lorenzo.

“Eu não saberia dizer qual o futuro do governo Petro, porque tudo na política, em qualquer país, é uma correlação de forças. E o que a gente vai precisar medir são justamente o comportamento que essas forças liberais tolerariam diante de um novo mandato da esquerda”, esclareceu o analista.

“Há muitos problemas no governo Petro, há muita demanda reprimida. […] Agora, quando você não tem força nesses espaços da democracia liberal, você tem que buscar espaço onde você tem, que [no caso de Petro] são os movimentos populares, as organizações, etc. Então eu acho essa ação não só recomendável como natural da esquerda organizada”, analisou Stédile.

O podcast O Estrangeiro é apresentado por Lucas Estanislau e Rodrigo Durão ao vivo toda quinta-feira às 10 horas.

Veja mais