A irmã de Julieta Hernández – brutalmente assassinada no estado do Amazonas em 2023 –, Sophia Hernández, teve encontro com representantes do governo federal para discutir o andamento do caso, pleitear a reclassificação do crime para feminicídio e acompanhamento do processo na Justiça amazonense por parte das autoridades brasileiras
Artista circense venezuelana, ela viajava de bicicleta pela Brasil. O crime ocorreu em Presidente Figueiredo (AM), pouco antes do Natal de 2023, quando ela foi atacada dormindo, estuprada e teve o corpo queimado. O corpo e parte da bicicleta da vítima só foram encontrados em 5 de janeiro de 2024.
Um casal que morava na região onde Julieta estava confessou o crime. O homem e a mulher estão presos e respondem por latrocínio (roubo seguido de morte). No entanto, os pertences dela não foram roubados, mas sim ocultados junto com o corpo.
O encontro contou com a presença de Sophia Hernández, irmã de Julieta, acompanhada do advogado da família, Carlos Nicodemos, da ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, da secretária nacional de Acesso à Justiça, Sheila Carvalho, da presidenta da União Brasileira de Mulheres (UBM), Vanja Andrea Santos e da primeira-dama, Janja Lula da Silva.
Segundo Nicodemos, a reunião foi um passo positivo no enfrentamento das dificuldades processuais. “Houve vários encaminhamentos no campo do monitoramento do caso no sistema de Justiça local – e aí está a importância da Secretaria de Acesso à Justiça, que vai adotar inúmeras medidas, entre elas a questão de levar o protocolo de feminicídio para o Tribunal de Justiça do Amazonas – além de outras medidas também no âmbito das políticas públicas.”
A UBM apresentou um dossiê propondo políticas públicas de proteção dos direitos das mulheres viajantes em território brasileiro e ações de memória, afirmação e fortalecimento das atividades que a artista desenvolvia. A ideia é dar continuidade ao trabalho social que era desenvolvido por Julieta Hernández.
O documento traça um panorama completo da história dela, desde sua trajetória como artista de rua, cicloviajante e migrante, até os trágicos eventos que culminaram em seu assassinato. Além disso, reconstrói minuciosamente os desdobramentos do caso, com foco na comoção popular gerada pelo crime e nos protestos realizados em mais de 160 cidades no Brasil e no exterior.
Também estão detalhados no dossiê os entraves no processo judicial, inclusive na tentativa de reclassificação do crime. A família, a UBM e o Ministério das Mulheres defendem o tratamento do caso como feminicídio, dadas as circunstâncias cruéis da morte da artista, que evidenciam a violência de gênero.
Além disso, o andamento do julgamento encontra diversas dificuldades. O advogado Carlos Nicodemos detalhou a instabilidade jurídica do caso. “O processo encontra enormes dificuldades de tramitação. Acompanhamos sucessivas mudanças de promotores e juízes. A última foi relativa ao juiz designado no início deste ano, a partir do pedido de saída da juíza que fez as duas primeiras audiências. Há duas semanas, ele foi afastado pelo Conselho Nacional de Justiça acusado de corrupção.”
Diante desse cenário, o dossiê da UBM apresenta um extenso requerimento ao governo e às autoridades competentes para monitoramento e acompanhamento do caso, visando a garantia de tratamento político, jurídico e social a partir da perspectiva de gênero, reconhecimento do feminicídio e motivação de xenofobia.
Na lista de ações com esse fim estão a retirada do processo da comarca de Presidente Figueiredo, apoio do Ministério das Mulheres e do Ministério da Justiça à família nas demandas jurídicas e apoio governamental para a criação da ONG binacional Movimento Julieta Para Sempre, para promover o legado da artista na descentralização da arte.