A tradicional marcha do 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, em Porto Alegre (RS), aconteceu neste sábado (8), com concentração no Largo Glênio Peres, no centro da Capital. O ato unificado denunciou as diversas violências que recaem sobre as mulheres, reunindo feministas, movimentos sociais, sindicais e apoiadores. Mesmo ao sol de 40 graus, a manifestação contou com a participação de mais de 1500 pessoas.

Além das pautas históricas de luta das mulheres, como o fim da violência, feminicídio e igualdade de gênero, o ato levantou as bandeiras contra o negacionismo climático, fim da escola 6×1 e sem anistia para golpistas.
A coordenadora do ato pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e pelo Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers), Suzana Cecília Lauermann, explica que todas essas pautas são de grande importância porque atingem diretamente a vida das mulheres.
“A questão da violência de gênero é muito cara para nós e é nossa principal pauta. Mas a gente sabe que somos as mais afetadas por todos esses eventos climáticos que têm acontecido, as enchentes, a seca, o excesso de calor. A escala 6×1, para nós acaba sendo 7×0. Nós trabalhamos em três jornadas, muito mais do que duas. E para concluir, a gente sabe que defender a democracia é fundamental e que o peso da ditadura é muito maior para gente. Com a extrema direita ganhando força no mundo, não podemos permitir que isso aconteça no Brasil. Por isso é prisão para golpista, sem anistia, é Bolsonaro na cadeia”, pontua Suzana.

“Esse 8M para nós tem um significado importante por ser unificado e com toda a intenção de defender que as políticas públicas para as mulheres aconteçam de fato”, defende a vice-presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Silvana Conti.

A pluralidade das pautas das mulheres
Rosa Beltrame, uruguaia, que vive há 48 anos no Brasil, dos seus 73 anos de idade, 53 foram de militância política. Para ela hoje não é um dia para celebrar, é um dia para fortalecer a luta da mulher contra o feminicídio, contra os assassinatos, contra as mortes de nossos próprios filhos, contra o massacre imperialista. “Estou aqui para levar uma mensagem para todas as mulheres de que sigam seus sonhos. Eu luto e resisto por um mundo mais justo e igualitário e juntas venceremos”, defende sorrindo.

Kate Lima Tikuna representante da etnia Tikuna, do Amazonas, que vive em Porto Alegre há 24 anos, declara a importância da liberdade dos indígenas e das mulheres indígenas na luta contra o etnocídio como no caso da Daiane. “O 8M para as mulheres indígenas é luta, é força. Nos enterram todos os dias, mas esquecem que somos sementes e nascemos mais fortes. A nossa ancestralidade das nossas bisavós, avós, mães, é que nos dão força para viver. Mesmo tentando nos matar a gente vai resistir porque existimos! Esse etnocídio acontece todos os dias e tem que parar. Só com a união de todas as mulheres vamos vencer essa luta contra o patriarcado.”

Josiane França, cega há 17 anos, participa do movimento brasileiro de mulheres cegas e com deficiência há 13 anos. “Estar no 8M é de suma importância para trazer visibilidade às mulheres com deficiência que estão sempre excluídas, nunca somos lembradas. É uma luta incansável que venho trilhando, me fazendo presente para que nossa pauta esteja à frente.”

Hack Basilane, LGBT+, trans masculino não binário, considera a luta das mulheres muito similar a sua, tais como a violência de gênero, com preconceito, abuso sexual. “Sou militante de direitos humanos e estou me somando a esse dia e essa luta tão importante por direitos, aos quais temos várias em comum.”

A arte também fez parte do ato. Tiveram intervenções da Terreira da Tribo, em defesa da Palestina na frente do Mac Donalds em alusão às empresas que apoiam Israel, do maracatu Baque Mulher, grupos de capoeira e a bateria de movimentos sociais como do Levante Popular da Juventude.
“É uma intervenção com várias camadas, que traz a questão da luta contra a cultura do machismo, misoginia e o feminicídio. Ela traz as mulheres palestinas se relacionando através das cores da bandeira, onde cada cor tem seu significado. Pautando esse genocídio que tem acontecido na Palestina e o povo está assistindo. E trouxemos uma faixa dizendo que mesmo que este ano não seja o último da violência de gênero, será o último ano em que as mulheres estarão caladas por qualquer motivo. Nós temos muito a dizer. E observamos isso no mote do 8M que traz a escala 6×1, a crise climática e outras questões, além da importância da vida das mulheres”, explica a atuadora Tania Farias, da Terreira da Tribo.

“Eu estou com um trabalho sobre a Maria Glória, bailarina, trabalhadora das artes, assim como eu, que foi violentada e assassinada no Paraná. Minha amiga, que eu estou levando para cena comigo numa performance de teatro que eu vou apresentar muito este ano, dentro e fora de Porto Alegre, que é uma denúncia, um ato poético contra o feminicídio. Com muitas poesias, danças e canções de mulheres como nós. Lembrando Julieta e muitas outras mulheres que foram assassinadas e merecem justiça”, pontua Tânia.
Cláudia Santos, da Frente Gaúcha de Solidariedade ao Povo Palestino, defende a causa das mulheres palestinas que mesmo após o cessar-fogo não tem sido respeitado o regime do Apartheid Israelense. “Da mesma forma tem acontecido no Líbano, esse desrespeito aos acordos. Então, as mulheres palestinas em Gaza e na Cisjordânia estão sendo deslocadas a força, perdendo seus filhos, sendo capturadas e sequestradas por um exército. Esse é o momento de denunciar e chamar a população para se solidarizar e boicotar as empresas que patrocinam esse genocídio e fazer com que os governos rompam qualquer relação com Israel.”

Mulheres na militância
Lara Rodrigues, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), reforça a importância da luta da mulher do campo com todo o desastre climático que estamos vivendo. “Hoje a gente dá início a uma jornada de lutas pelo fim da violência contra as mulheres. É um dia de luta do campo e da cidade e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) se une para dialogar com a sociedade contra as violências, como a escala de trabalho 6 x 1, em prol da democracia e a por alternativas à crise climática. E para nós do MST a questão ambiental está dentro da nossa pauta de lutas, das mulheres do campo, porque uma das violências que sofremos é a violência que o capital exerce sob a gente. E ele no campo tem nome, é o agronegócio, e é ele que também provoca esses processos de crise climática. Por isso estamos aqui, porque juntas somos mais fortes.”

Drica Cordonet, integrante da Marcha Mundial das Mulheres, explica que a escala 6×1 é extremamente violenta com as mulheres. “Quando a gente tem exploração sob o trabalho feminino, sob nossos corpos, sob nossa identidade, a gente recai em ambientes em que a escola 6×1 é nociva as nossas vidas. Essa escala atinge principalmente as classes mais marginalizadas, mulheres pretas, periféricas, mães solteiras e atípicas e a comunidade LGBT. Estamos aqui hoje para fortalecer a luta e mostrar que as mulheres unidas revolucionam.”

Para Carla Almeida, do Grupo de Apoio e Prevenção da Aids (Gapa), é preciso reafirmar o compromisso com as iniquidades sociais, raciais e de violência de gênero. “Para nós, no campo do HIV e da Aids, é fundamental que a gente considere os determinantes sociais que tornam as mulheres mais vulneráveis tanto na infecção de HIV quanto no processo de morte por Aids. Aqui no Rio Grande do Sul há uma epidemia generalizada, heterossexual, onde quem mais morre de Aids são as mulheres negras. O machismo mata todos os dias e mata também de Aids.”

“Estarmos aqui nesse dia quente, na rua, reafirma a força e a luta pelos direitos da mulher”, acredita Mariana Dambroz do Levante Popular da Juventude. “Hoje é um dos dias mais quentes do ano e temos lutado com isso todos os dias. E mesmo assim somamos mais de 1500 pessoas para combater a crise climática e esse avanço da extrema direita, defendendo os direitos das mulheres em questões que temos que avançar aqui nesse ato unificado do 8M. E a gente sabe quem é o nosso inimigo, o capital é nosso inimigo.”

Mulheres na política
A vereadora Juliana de Souza, militante do PT há 17 anos, afirma que durante sua militância sempre conviveu com a violência política de gênero. Não apenas fora, mas dentro dos espaços políticos e por isso vê a importância de estar nas ruas nesta data.
“8 de março marca um dia de luta das mulheres por nossas vidas, por nossos corpos, pelos direitos, pela democracia. Só na democracia há o direto das mulheres, principalmente para que a gente possa dialogar com a sociedade que em um Brasil patriarcal, escravocrata, fundado sobre a misoginia, todas as lutas da classe trabalhadora são das mulheres porque nós somos a maioria da classe trabalhadora. Então, quando a gente defende uma política de moradia para o nosso povo, estamos defendendo as mulheres. Quando a gente luta por uma cidade com resiliência climática, a gente está defendendo a luta das mulheres. Para nós é importante mostrar que o debate da cidade é um debate das mulheres. Nós queremos uma Porto Alegre pelo olhar das mulheres.”

A deputada estadual Bruna Rodrigues (PCdoB), primeira mulher negra eleita na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, também considera o espaço da política patriarcal.
“Esse é um 8M muito atípico. Para além da nossa jornada de lutas que acontece todo ano, esse ato de hoje fala sobre um outro país, que nós sonhamos, que nós queremos, sobre um estado que nós precisamos reconstruir. Mas acima de tudo sobre uma política que nós precisamos questionar. Somos o quarto estado que mais mata mulheres. E nesse início de ano o que venceu foram os feminicídios, então essa é uma jornada em defesa da vida, que não acaba em março. A gente se encontra na luta todos os dias. Hoje é um marco de uma jornada que inicia e que não acaba porque enquanto a vida das nossas mulheres estiverem ameaçadas ainda estaremos na luta.”

Para além das pautas das mulheres, a deputada federal Fernanda Melchionna (Psol) considera o dia muito importante para fortalecer a luta para enfrentar a extrema direita. “Golpista na cadeia, para que os crimes da ditadura sejam punidos. E colocar as pautas políticas do nosso tempo é diretamente relacionado com a luta das mulheres para construir um futuro de agenda econômica a favor das trabalhadoras, acabar com o arcabouço fiscal e garantir uma política que melhore a vida do povo”, afirma a deputada.
Também participaram do ato unificado as vereadoras Karen Santos, Grazi Oliveira e Atena Roveda do Psol, Biga Pereira (PCdoB), Natasha Ferreira (PT) e a deputada federal Daiana Santos (PCdoB).

A luta é de todas
Ceniriani Vargas da Silva, coordenadora do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), defende moradia digna como um direito das mulheres. “O 8 de março vai muito além do dia 8. É uma série de encontros e plenárias que acontecem por semanas, com a intenção de convergir a luta das mulheres. A nossa pauta da luta por moradia é uma pauta das mulheres. A grande maioria das pessoas nas ocupações são mulheres. Inclusive existe uma grande vinculação entre o déficit habitacional e a própria violência doméstica. Muitas mulheres que fogem de uma situação de violência tendo como única alternativa abandonar a sua casa e ir morar em ocupações. E hoje vivemos numa realidade de criminalizar essas ocupações.”
A coordenadora estadual do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) Maria Aparecida Castilhos, também afirma que a maior parte dos atingidos são mulheres por vários motivos. “800 mil pessoas vivem em áreas de risco, mas são as mulheres as mais prejudicadas. Nós vamos fazer uma vigília no dia 10 de março no Sarandi em defesa das mulheres atingidas pelas enchentes que estão sendo retiradas de suas casas sem ter um futuro certo para suas famílias. Assim como pedimos o apoio de toda mulherada para o julgamento no dia 10 de junho da nossa companheira Débora que sofreu feminicídio do marido”, convida.

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