A economia do Brasil cresceu 3,4% no ano passado, obtendo assim seu melhor desemprego desde 2021 – bem acima das expectativas para o ano. O resultado poderia ter sido ainda melhor não fosse a queda da produção agrícola causada pela seca que atingiu o país no início do ano passado.
Em 2024, aliás, as mudanças climáticas tiveram peso relevante no desempenho da economia do país. A falta de chuvas prejudicou o desempenho da agricultura mas, por outro lado, o calor intenso, resultado do aquecimento global, aumentou o uso de ar-condicionados e de energia elétrica, elevando a atividade econômica nacional.
Os dois efeitos foram destacados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na divulgação do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 2024, realizada na última sexta-feira (7).
O PIB é a soma, em valores monetários, de toda a produção nacional durante o ano. É por meio dele que se calcula o crescimento de uma economia.
No ano passado, segundo o IBGE, a produção do setor agropecuário encolheu, prejudicando o crescimento total da economia. A queda da produção agropecuária foi de 3,2% na comparação com o valor verificado em 2023. O motivo foi o clima.
“Efeitos climáticos adversos impactaram várias culturas importantes, ocasionando quedas em suas estimativas anuais de produção, com destaque para a soja (-4,6%) e o milho (-12,5%)”, descreveu o instituto, que também monitora as safras no país.
Mauricio Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), acrescentou ainda que o calor registrado em 2024 prejudicou a colheita de oliva e a safra de café do ano, o que também trouxe impactos para o PIB – e para a inflação, já que só o café moído subiu 39,6% durante o ano passado.
Eletricidade
Em compensação, as altas temperaturas impulsionam o faturamento da indústria de energia elétrica, gás, água e gestão de resíduos. O setor cresceu 3,6% em 2024 – acima da média geral da economia – impulsionado pelo setor elétrico. Segundo o próprio IBGE, isso foi “influenciado pelo aumento das temperaturas médias do ano.”
“Existe uma relação no Brasil muito direta entre temperatura e consumo de eletricidade, justamente por causa do ar-condicionado”, explicou Ikaro Chaves, engenheiro eletricista e ex-funcionário do sistema Eletrobras. “Hoje, a influência do ar-condicionado é tão grande que ela fez com que o próprio horário de pico de consumo mudasse. Antes, a gente tinha um horário de pico muito pronunciado entre às 17h e 20h30. Hoje é 14h.”
“Os recordes de demanda de energia coincidem com os recordes de temperatura no país”, acrescentou Clarice Ferraz, economista e diretora do Instituto Ilumina.
Ela reforça o efeito dos ar-condicionados sobre o consumo de energia no país. Cita também outros efeitos, que tendem a se agravar com aumentos cada vez maiores de temperaturas. “Todos os motores consomem mais, tudo consome mais”, disse. “Você tem perdas elétricas maiores. Por isso a correlação entre consumo de energia.”
Tendências
Weslley Cantelmo, presidente do Instituto Economias e Planejamento, disse que as mudanças climáticas tendem a ficar mais intensas com o passar dos anos, já que o esforço para a contenção da emergência climática global tem sido insuficiente.
O aquecimento e suas consequências têm forte impacto sobre a agricultura, disse Cantelmo. Sob os efeitos dele, a produção do setor tende a ser cada vez mais instável.
Em 2023, por exemplo, a produção agropecuária cresceu 15,1% e puxou a expansão da atividade econômica nacional. Em 2024, houve a queda. Para 2025, o governo prevê uma safra recorde. Cantelmo tem dúvidas sobre isso.
“Eu não consigo vislumbrar uma safra tão grande considerando os modelos climáticos que tenho visto, que apontam para um ano de seca”, afirmou. “Essa questão das mudanças climáticas me preocupam. Uma preocupação extrema.”
Para Cantelmo, até quando os efeitos delas sobre a economia parecem positivos, há pouco para se comemorar. Segundo ele, o aumento do consumo de energia no país quase não se reverte em emprego e renda para a população, diferentemente de quando há crescimento da indústria automobilística ou da construção.
Weiss disse que é possível que o aquecimento global crie oportunidades no Brasil para geração de energia eólica e fotovoltaica, por exemplo, ou até para fabricação de materiais para isso. Cantelmo, por sua vez, disse que é preciso investimentos massivos nessas áreas para tornar a indústria brasileira competitiva. Hoje, eles são pequenos.
“A gente teria que ser mais ágil, mais agressivo nesse sentido no desenvolvimento de uma indústria de adaptação. Mas as condições para investimento no Brasil não estão muito facilitadas”, reclamou o economista, lembrando da alta dos juros e das restrições fiscais que o governo decidiu se comprometer.