A prisão do ex-presidente das Filipinas Rodrigo Duterte a pedido do Tribunal Penal Internacional (TPI) é menos uma conquista da defesa dos direitos humanos e mais o resultado de conveniência política para o atual presidente e sua família, segundo Cecilia Lero, cientista política pela Universidade de Notre Dame e pós-doutoranda no Centro de Estudos da Metrópole da Universidade de São Paulo (USP).
Para a analista filipina, “por um lado, a prisão é vista como uma vitória. As Filipinas têm um problema terrível de impunidade e, apesar de muitos políticos de alto escalão, inclusive presidentes, terem cometido crimes graves em termos de abusos de direitos humanos e corrupção, nenhum deles jamais ficou na cadeia”.
Entre eles, Ferdinando Marcos, que governou o país por 21 anos, sob mantos de corrupção e fechamento do Congresso e “que cometeu abusos sistemáticos contra os direitos humanos, mas nunca foi preso”. Ele é pai de Ferdinando Marcos Jr. atual presidente das Filipinas.
Por outro lado, avalia a analista política, “embora os defensores dos direitos humanos tenham pressionado por isso, é difícil dizer que se trata de uma vitória da comunidade de direitos humanos”. “A comunidade não tem poder político para algo assim”, diz.
Para a analista, a rivalidade política entre as famílias Duterte e Marcos pode ter sido fator muito mais relevante para a prisão.
“É muito mais provável que isso ocorra porque o atual presidente [Ferdinando Marcos Jr.] vê a família Duterte como a única rival política viável de sua família. Embora existam algumas uniões dentro da coalizão governista […], que também têm feito lobby para a prisão de Duterte, eu realmente acho que o fator decisivo é a conveniência política para a família Marcos.”
Cecilia Lero elenca algumas alguns elementos que tornariam a ação, de fato, sobre justiça e combate à violação dos direitos humanos: “[a criação de] uma comissão da verdade, ir atrás de generais de polícia que passaram pano nos registros de assassinato e reforma institucional da Polícia Nacional da Filipina, além de algum tipo de reforma institucional de longo prazo que reforme os danos à instituição [governamental].
“Alguns ainda esperam por outros pedidos de prisão, de conselheiros próximos à Duterte durante a ‘guerra às drogas’, mas isso parece improvável”, acrescenta Cecilia.
Na última terça-feira (11), Rodrigo Duterte decolou em um avião com destino à Haia, na Holanda, após um mandado do Tribunal Penal Internacional (TPI) decorrente de sua repressão mortal ao tráfico de drogas. Quando questionado sobre um possível retorno político de Duterte, a analista diz que “é difícil saber” qual será o seu futuro.
“Os políticos filipinos têm mais vidas do que gatos. Mas ele é bastante idoso. A melhor pergunta é se esse será o fim para sua filha, a atual vice-presidente.”
Sara Duterte, filha de Duterte, ocupa atualmente o cargo de vice-presidente das Filipinas, e uma condenação de seu predecessor político poderia levar a sua própria carreira para o fundo do poço, segundo a cientista política. “Os Marcos certamente esperam que sim, mas não creio que haja uma resposta definitiva [para o futuro dos Duterte]”.