O ex-secretário de Desenvolvimento Social do município de Porto Alegre, Léo Voigt, afirmou em seu depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o incêndio da Pousada Garoa que, “apesar de ter sido um infortúnio, o incêndio foi criminoso”. Voigt foi a primeira testemunha a depor na CPI instaurada pela Câmara Municipal de Vereadores para investigar e definir as responsabilidades de um incêndio numa unidade da avenida Farrapos, em Porto Alegre, que vitimou 11 pessoas e deixou outras 15 hospitalizadas no dia 26 de abril de 2024.
A CPI é presidida pelo vereador Pedro Ruas (Psol) que afirmou “procurar estabelecer a verdade para que se faça justiça”. Na avaliação de Ruas, o foco da CPI não será determinar de que forma o incêndio aconteceu, mas sim esclarecer os motivos pelos quais as pessoas não conseguiram sair do local, salvar suas vidas.

“Alguém botou fogo, ou houve um curto-circuito, mas porque motivo as pessoas não conseguiram sair? Será que havia portas trancadas com cadeados, conforme denúncias publicadas na imprensa?, observou Ruas. O presidente da CPI destacou sua perplexidade ao ouvir o depoente informar que cada morador tinha seu próprio cadeado. “Algo muito estranho que precisa ser esclarecido devidamente. Mas, ressalvo que também me surpreendeu o fato de o ex-secretário ter assumido a responsabilidade política pelo ocorrido.”
Voigt afirmou que apesar de nunca ter estado na unidade incendiada tinha conhecimento de um relatório feito pela fiscalização em novembro de 2023, recomendando melhorar a limpeza em áreas comuns e fazer reparos em azulejos. Ele disse ainda acreditar que o incêndio foi provocado por uma pessoa que ingressou no local naquela noite: “Tudo indica que não se trata de uma tragédia, mas de um infortúnio, em que houve participação humana. Houve o concurso da mão humana, a pousada não se autoincendiou”.

Conforme ele, qualquer prédio é incendiado, caso uma pessoa provoque o fogo: “Se alguém vai em qualquer equipamento e bota fogo, não há o que fazer, e fica esse ônus para nós”. O ex-secretário ressaltou que a porta principal de acesso ao prédio não era fechada com cadeado, e tampouco havia portaria. Afirmou que o edital para prestação do serviço não exigia que houvesse portaria e disse que “hoje, eu colocaria porteiro”.
Fiscalização
O ex-secretário também explicou que a fiscalização se limitava à habitabilidade e à dignidade para residir no local, e que não havia vistorias de engenharia ou das condições de prevenção de incêndio. Ele negou que a fiscalização fosse acertada previamente entre a prefeitura e a empresa: “Não havia conluio de nenhuma natureza entre o serviço de assistência social e a Pousada Garoa”. Voigt ressaltou não conhecer o proprietário da empresa.
Não houve nenhum pedido para interdição das unidades ou interrupção do serviço, de acordo com ele. “Em média, as condições das Pousadas Garoa eram suficientes para que nenhum órgão público pedisse a interdição”, ressaltou. Informou também que a prestação de serviços da pousada ao município teve início a partir de um edital em 2020, ainda na gestão de Nelson Marchezan Jr. Houve continuidade na administração do prefeito Sebastião Melo, com renovações e, posteriormente, um novo edital. De acordo com ele, apenas a Pousada Garoa apresentou proposta na licitação. Voigt afirmou que, legalmente, não seria possível exigir que a pousada tivesse PPCI ou alvará. O custo era de R$ 3 milhões por ano, informou.
O serviço prestado pela pousada era bastante procurado por pessoas em situação de vulnerabilidade. “Chegamos a ter 400 pessoas que aderiram a essa política.” A rescisão de contrato não era cogitada, pois implicaria que centenas de pessoas voltassem às ruas, de acordo com Voigt.
O ex-secretário se afastou da direção do serviço logo após o incêndio e as enchentes do ano passado, porém alegou na CPI tratar-se de uma decisão pessoal. “Não tinha condições de tomar outra decisão. Passei a vida toda priorizando o trabalho, e esse foi um momento em que não priorizei o trabalho.” Ele refutou que essa decisão tenha caracterizado abandono do cargo ou omissão.
Trabalhos da comissão
A reunião dessa segunda-feira iniciou com o depoimento de Léo Voigt. Na mesma oportunidade seria discutido e aprovado o plano de trabalho, porém a oitiva demorou cerca de duas horas, ficando para outra reunião, ainda nesta segunda, para a aprovação do Plano. Na prática, o projeto apresentado por Ruas foi mantido, porém com acréscimo de alguns depoentes. “Certamente teremos condições de ouvir todas essas e, ainda, receber mais contribuições que nos permitirão ter tudo muito claro e fazer justiça”, disse Ruas.
Ainda participaram do questionamento ao ex-secretário os vereadores Giovani Culau (PcdoB), Erick Dênil (PcdoB) e Alexandre Bublitz (PT). Integram a CPI os vereadores Hamilton Sossmeier (PL), Cel. Ustra (PL), Rafael Fleck (MDB), Mauro Pinheiro (PP), Moisés Barboza (PSDB), Gilvani o Gringo (Republicanos), Ramiro Rosário (Novo) e Marcos Felipi Garcia (Cidadania).
A CPI foi instaurada em 26 de fevereiro de 2025 e suas reuniões ordinárias acontecerão todas as segundas-feiras, das 9h30 às 11h30. O encerramento da CPI está programado para o dia 25 de junho. Na próxima segunda-feira (24) serão ouvidas as testemunhas Elton Bozzetto, da Pastoral do Povo de Rua, Marguet Inês Hoffmann Mittmann, da direção geral do Instituto Geral de Perícias (IGP), e Carlos Cesar da Costa Silva, morador e vítima sobrevivente.
