Estamos realmente num beco sem saída, num mato sem cachorro?
Emergência climática, crise nos modelos de democracia, ameaças de nazifascismo atualizado, Inteligência Artificial decidindo e manipulando pessoas e "escolhas", falta de sensibilidade para com a vida no planeta… Tudo isso e mais algumas coisas, nos coloca num caldeirão de sombras, de ameaças, mexidas e amalgamadas pelo velho/novo capitalismo.
O mundo possível que a gente pode compartilhar não tem que ser um inferno, pode ser bom. (Pepe Mujica)
Como sabemos, o modelo econômico hegemônico mundial se alimenta de guerras convencionais, conflitos armados, tanto no sentido literal conhecido como também das chamadas guerras híbridas, em um vale tudo sofisticado de dominação, incluindo o uso da Justiça, sanções e dominação cultural. Também se sustenta com a devastação da natureza tendo como mira o lucro, e a exploração cada vez mais refinada do trabalho humano, que numa versão mais atualizada, inclui a retirada de direitos sociais e trabalhistas.
Tudo isso está sendo piorado – estamos acompanhando ao vivo e em cores, a cada dia – e não sabemos ainda em que nível de insanidade vamos mergulhar… O recente pacote de medidas do atual presidente dos Estados Unidos é bom exemplo do tamanho da encrenca.
Se estamos no fundo do poço, sabemos, por outro lado, que é no meio do caos que podemos dar saltos evolutivos significativos, novos paradigmas podem surgir. Ficarmos presos na crítica, no ódio e no medo não é uma atitude inteligente. Fazendo assim, só reforçamos o que querem nos impor.
Precisamos criar um campo de energia e de irradiação de paz, amorosidade e fraternidade, cada vez mais amplo. Criarmos contrapontos de rebeldia e resistência ancorados no que de melhor possui a alma humana, em valores universais. Afinal, o que acontece fora, primeiro se plasma dentro da gente. Para o bem ou para o mal.
O espírito da democracia não é uma coisa mecânica, a ser ajustada pela abolição de formas. Exige uma mudança do coração. (Mahatma Gandhi)
Procuremos ficar a par do que acontece no mundo, no nosso país, a nossa volta, mas sem ficarmos presos nas redes sociais e aos veículos da grande mídia. Ao nos empanturrarmos de informações, manipulações e desinformações (nesses tempos de pós-verdade, a mentira já consegue fazer estragos imensos), estamos reforçando o jogo de poder que tentam nos impor.
Manter a nossa tranquilidade, o estado de paz interior e conexão com nossa criança interior, faz toda a diferença para efetuarmos os contrapontos necessários.
Se tentam nos impor um tipo de vida em que o consumo, "consome" a nossa vida, vivamos em simplicidade, consumindo menos, atentos aos danos a nossa Casa Mãe.
Se querem nos envolver numa cultura de ódio, de arrogância, de competição, de aniquilamento do outro diferente de nós; procuremos viver a cooperação, o amor, a humildade, a fraternidade, o respeito ao outro diferente de nós.
Se tentam nos deixar tristes, sem perspectivas, sejamos alegres, bem-humorados e resilientes.
Se tentam nos deixar acomodados, naquela base "o mundo não tem jeito, não podemos fazer nada"; renovemos os nossos sonhos e utopias mais caras. Acreditemos nos sonhos "impossíveis".
…Sonho que se sonha junto é realidade (Raul Seixas)
Não deixemos nunca que suprimam a nossa capacidade de sonhar, de criar, de brincar, de dançar e cantar, fazer amor e curtir poesia. De se encantar com o nascer e o pôr do sol, com a contemplação das estrelas…
É esse tipo de contraponto, de resistência, que vai minar a cultura da morte, da destruição. Nunca como agora necessitamos trazer pra nossas ações e vida interior o verbo esperançar (a bênção Paulo Freire, que acreditou e lutou por uma educação para a liberdade).
Mirem-se no exemplo de um Gandhi, de um Luther King, de uma Rigoberta Menchu, de um Pepe Mujica, e muitos outros seres de luz comprometidos em ressaltar o melhor da nossa condição de ser humano. São inspirações com poder de atravessar o tempo.
Outro ponto muito importante: hoje em dia está ficando cada vez mais clara a necessidade de resgatarmos a sabedoria dos povos ancestrais, tão invisibilizados e massacrados pela cultura dos colonizadores. Precisamos aprender com suas visões de mundo, como lidam e se conectam com a natureza, com a vida. Pode depender muito desse aprendizado a nossa sobrevivência como espécie. É dessa fonte dos povos ancestrais que nasceu a expressão Consciência Pachamama. Ela nos convoca e instiga a sermos radicalmente em defesa da vida.
Devíamos admitir a natureza como uma imensa multidão de formas, incluindo cada pedaço de nós, que somos parte de tudo: 70% de água e um monte de outros materiais que nos compõem. (Ailton Krenak, Ideias para adiar o fim do mundo)
Há algo mais revolucionário do que defender a vida sob todas as formas, em meio a uma cultura de morte que tentam nos impor como algo normal e até mesmo necessário? Exemplo: lembram da expressão "efeito colateral" dita na televisão e canais das redes sociais, se referindo a mortes de milhares de civis palestinos, especialmente crianças?
É preciso, urgente, sonharmos alto e imaginarmos um mundo sem armamentos, sem ódios, sem fronteiras, sem muros, onde todos possam viver em paz, unidos na diversidade, enriquecendo-se com o diferente, complementando-se. Por que não?
Primeiro imaginamos na nossa mente, inspirados pelo coração (é importante fazermos a pergunta do xamã mexicano: esse caminho tem coração? Se não tem, deixe-o), o segundo passo é a concretização do que imaginamos.
Imagine todas as pessoas vivendo o presente. Imagine que não há países. Não é difícil. Nenhum motivo pra matar ou morrer. (Imagine, John Lennon)
Ao invés de ficarmos criando inimigos, ódios para justificar opressões e aniquilamentos, é preciso nos focarmos no aprendizado leve e resiliente de comungar, esperançar e sentir. Unir mente, coração e alma – o Ser Pleno.
O Paraíso é aqui! Descubramos juntos, juntas!
* Zulema Mendizabal, ativista da Nación Pachamama
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.