É urgente a construção de uma política pública consistente de enfrentamento a eventos climáticos extremos, de gestão dos riscos que deles ocorrerem, preservando as vidas, os bens e os territórios.
Há décadas povos tradicionais e especialistas alertam a humanidade para as consequências das mudanças climáticas. Eventos extremos, como o que assola o estado do Rio Grande do Sul, são (e continuarão sendo) cada vez mais frequentes.
Altos índices de desmatamento, subsídios cada vez maiores aos combustíveis fósseis, investimentos em commodities para exportação em detrimento da priorização de modos de produção sustentáveis, alicerçado por políticas públicas que trabalham em prol do avanço do capital, todos esses fatores são responsáveis pela atual crise do clima. Lembrando também que a especulação imobiliária contribui e muito com esse quadro.
Investir em ações de mitigação das mudanças do clima é tão urgente e necessário quanto destinar recursos para perdas e danos.
De acordo com a análise mais recente do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) sobre o balanço do orçamento da União, os gastos do governo federal para gestão de riscos e resposta a desastres, por exemplo, foi aumentado em 30 vezes, saindo de R$ 1,44 milhão em 2022 para R$ 43,72 milhões em 2023. Mesmo com o incremento, é possível avançar mais. Isso porque quando olhamos para o orçamento total autorizado para o ano passado, R$ 299,7 milhões, a execução financeira foi de apenas 16%. Para 2024, o cenário orçamentário é melhor, pois o Programa Gestão de Crise e Desastres teve o orçamento autorizado de R$ 2,29 bilhões.
A experiência do Rio Grande do Sul nos revela que, apesar do aumento dos gastos federais nessa área, os recursos são insuficientes. Somente para o estado gaúcho, o governo federal anunciou um aporte de R$ 50 bilhões para apoio às vítimas e projetos de logística e infraestrutura, por exemplo. No que trata dos atingidos, o que foi anunciado é apenas antecipação de recurso, como do Bolsa Família, BPC e Auxilio Gás.
A crise climática que enfrentamos agrava problemas históricos dos grupos vulnerabilizados, como habitações em locais de risco e sujeitos a enchentes, alagamentos e enxurradas. São principalmente as mulheres negras, povos indígenas e quilombolas e as juventudes periféricas os mais afetados por esses desastres. Assim como o segmento da agricultura familiar e ecológica e os empreendimentos solidários.
Uma campanha lançada por mais de 90 organizações da sociedade civil, entre elas o Inesc, tem por objetivo a construção de uma política pública para emergências climáticas. A proposta é que seja criado o Auxílio Calamidade Climática, não apenas para socorrer as atuais vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul, mas sim, uma reserva de emergência permanente para quaisquer eventos extremos relacionados ao clima. Com essa medida, será possível o governo federal garantir direitos às populações afetadas de modo mais rápido e eficiente.
A proposta é que esse auxílio pague às vítimas de eventos climáticos extremos a quantia de R$ 1.400,00, somado a R$ 150,00 para cada criança e adolescente que for responsável, por um período de 24 meses. O auxílio seria concedido por CPF e somente a pessoas com idade acima de 18 anos e renda individual de até 5 salários mínimos (ou R$ 7.050,00). O pagamento aconteceria via Cadastros dos Sistemas Públicos(CadÚnico, Cartão SUS, INSS), ou seja, sem necessidade de construir novo cadastro.
O Auxilio Calamidade Climática também incluiria os chamados “empreendimentos solidários”, isto é, organizações coletivas, como associações, cooperativas, empresas autogestionárias, grupos de produção, geralmente liderados por mulheres, mulheres negras, indígenas, catadoras/es, pessoas com deficiência e demais segmentos da sociedade em situação de vulnerabilidade, além da agricultura familiar e ecológica. Para esse grupo, haveria uma parcela única de R$ 20.000 pagos por meio de cadastros da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) do Ministério do Trabalho e Emprego (TEM) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). O acesso a esse auxílio não inviabiliza o acesso ao auxílio individual.
É crucial a atuação firme do Estado brasileiro na garantia de políticas com participação social que, de fato, avancem no enfrentamento das mudanças climáticas. Afinal, a falta de compromisso e ousadia tem o seu preço.
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*José Antônio Moroni é do colegiado de gestão do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos)
**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato – DF.
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