Poderão ocorrer novas chuvas volumosas inundando municípios, em especial Porto Alegre?
Certamente. Por enquanto não temos previsões da sua ocorrência tão proximamente. No entanto, é preciso considerar a profunda alteração das condições ambientais climáticas, especialmente com o sobreaquecimento global, que pode gerar desastres ambientais não tão facilmente previsíveis.
Não foi o que aconteceu nos recentes eventos em nosso estado. Em março de 2023, em evento realizado na Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS), climatologistas do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), apresentaram o mapa do RS mostrando exatamente a área que seria mais atingida, com o seguinte alerta: “Precisamos alertar os gaúchos que nesta região, a partir de setembro deste ano, estendendo-se adentro do primeiro semestre de 2024, teremos chuvas e temporais extraordinários”. Estas informações ou não chegaram aos governantes ou chegaram sem serem devidamente consideradas. Será que já não passamos da hora de escutarmos melhor nossos cientistas e profissionais?
E se as chuvas volumosas retornarem, estaremos minimamente preparados para recebê-las? A seguirem as atuais orientações e ritmos, com certeza não!
As Defesas Civil precisam estar bem melhor capacitadas em todas as suas atribuições.
O Saneamento Básico definido pelo Marco Civil do Saneamento é constituído pelo fornecimento de água potável, coleta e tratamento de esgotos, coleta e tratamento de lixos, drenagem urbana e proteção contra as cheias. A titularidade (responsabilidade) dos serviços, pela Constituição e por várias leis, é dos municípios. Necessita soluções definitivas muito mais rapidamente.
Na maioria dos municípios água e esgoto são concedidos, o serviço do lixo necessita ser melhor realizado, e drenagem e proteção contra cheias ficam literalmente parcial ou totalmente “pendurados num prego”. Obviamente os municípios necessitam de auxílio e apoios dos estados e União. Mas é fundamental que se estruturem melhor para acompanhar, fiscalizar e realizar os serviços de Saneamento. A realização do Saneamento integrado ao meio ambiente, entre outros aspectos recuperando arroios e implantando mais áreas verdes, produz mais e melhores resultados para a qualidade de vida e segurança dos cidadãos.
É urgente a recriação do DEP
Em Porto Alegre, para o município ter uma estrutura adequada, é urgente a recriação do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP), imprescindível para a segurança dos cidadãos, como as águas de maio 2024 bem provaram. E ao Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), a quem cabe o abastecimento de água e a coleta e tratamento de esgoto, não é justificável nenhuma modalidade de privatização.
Ainda durante as inundações em maio 24, um conjunto de 48 profissionais elaborou ao prefeito, outras autoridades e população de Porto Alegre uma “Manifestação”, que entre outras recomendações essenciais, pedia para tão “logo que as águas baixarem”, regularizar urgentemente o funcionamento das comportas e das Casas de Bombas, sem a manutenção corriqueira desde 2020. Como o prefeito não acreditou e nem acredita em nossa Manifestação, poderia escutar os holandeses que escreveram “O Sistema de Proteção contra Cheias de Porto Alegre para funcionar adequadamente precisa estar íntegro”. Significa reparar o que deixou de ser feito.
E o que está acontecendo? As comportas, ao invés de serem revisadas e reparadas, oito delas simplesmente estão eliminadas com concretagem nos respectivos espaços sem que as respectivas populações e órgãos fossem consultados sobre a sua necessidade. Em relação às Casas de Bombas está se contratando para uma e outra alguma consultoria, desconsiderando completamente o Plano para Ampliação e Modernização das Casas de Bombas, elaborado ainda em 2014, por engenheiros do DEP, que recebeu recursos a fundo perdido do governo federal, que foram perdidos em 2019, porque neste tempo todo a prefeitura não foi capaz (ou não quis) apresentar os respectivos projetos de engenharia. Mesmo assim, antes de 2024, havia tempo e dinheiro próprio para que o plano fosse executado. Bastaria agora ser retomado e atualizado, receber os projetos de engenharia e ser contratado.
Um dos diques deteriorados no Sarandi foi recomposto somente até a cota 5,5m, quando o projeto original, para a mesma proteção de todo o sistema, requer a cota 6,5m. Num outro dique é necessário o reassentamento de dezenas de famílias, que estão sendo retiradas com medidas de força, sem ainda terem onde morar.
As obras da prefeitura são realmente de chorar. O Centro Histórico, com suas belas pedras históricas nas ruas e passeios foi literalmente destruído. Em seu lugar agora encontramos inimagináveis placas de concreto. Seria muito interessante saber qual foi o parecer do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico sobre esta obra. Ou sequer houve este licenciamento desta obra? Este conselho deveria manifestar-se publicamente.
A “pérola” destas obras está ocorrendo no importante bairro de Ipanema junto à praia. Intempestivamente realizada desde o período eleitoral, ainda não concluída, conseguiu retirar das pessoas aquela importante área para encontros e passeios, especialmente durante o verão. Não havia nenhuma emergência para ser executada neste período.
A armadilha da mureta
Legalmente registrada junto ao Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado do Rio Grande do Sul (CREA-RS) para a “recuperação dos passeios”, está sendo alardeada como “obra de proteção contra as cheias de Ipanema”, porque junto ao passeio está sendo erguida uma mureta. Nada mais fake! Esta mureta é um elemento isolado, que não integra um sistema de proteção como é necessário. Ela tem início e fim; quando as águas do Guaíba elevarem-se irão entrar antes e depois desta mureta e, pela Lei da Gravidade, irão espalhar-se pelo bairro. Pior: quando as águas do Guaíba baixarem, estas águas estarão represadas por esta mureta, dificultando o seu escoamento. E ainda, quando as águas do Guaíba estiverem elevadas também irão invadir o bairro pelo Arroio Capivara.
Esta mureta é completamente inconveniente, além de ser uma armadilha para a proteção das cheias. Serve apenas para as pessoas sentarem. Dificulta completamente o acesso às areias onde acontecem esportes, caminhadas e banhos de sol. Também dificultará o acesso às águas que todos desejamos ver despoluídas o quanto antes para novamente poderem ser usufruídas.
*Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.