A despeito da popularidade do governo Lula estar em decréscimo entre evangélicos, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) critica a interpretação de que o PT tem dificuldade de conquistar o voto evangélico.
“Às vezes colocam que o PT não dialoga com os evangélicos, isso não é verdade. Nós somos evangélicos, estamos dentro do PT. E fora do PT tem evangélicos também em alguns outros partidos que comungam perfeitamente com o projeto do Partido dos Trabalhadores”.
“Não há nenhuma contradição nisso, nós somos evangélicos e andamos pelo mundo a falar de um Jesus, que é um Jesus que cuida dos pobres, dos desempregados, que cuida bem das mulheres, que cuida bem das pessoas e que não faz acepção de pessoas”. defende na edição desta quarta-feira (12) do Conversa Bem Viver.
A pesquisa mais recente divulgada pela AtlasIntel mostra que 80,1% dos evangélicos dizem estar insatisfeitos com o presidente. Todos os outros recortes religiosos – católicos, crentes sem religião, outra religião, agnósticos e ateus – dão a Lula aprovação maior que a desaprovação.
Evangélica, a parlamentar já está no seu sexto mandato como deputada federal e, segundo ela, está prestes a fechar este ciclo. O que não significa sair da carreira política, pelo contrário.
Segundo a parlamentar, em 2026 ela pretende se alçar a senadora.
Na entrevista, Benedita da Silva avalia também as mudanças ministeriais no governo e o sucesso de Ainda Estou Aqui entre evangélicos.
Confira a entrevista na íntegra
Como a senhora avalia as mudanças oficializadas nesta semana no corpo de ministros do governo federal?
O governo federal está procurando da melhor forma possível poder fazer os compromissos que ele assumiu com o povo brasileiro, e há momentos em que precisam fazer um movimento de ordem política para que as coisas possam andar mais.
É isso que o governo fez. Nós estamos felizes com a escolha do governo porque o Padilha já foi ministro da Saúde, foi o grande que criou o [programa] Mais Médicos, que serviram em vários outros lugares, nos rincões brasileiros, e a Gleisi Hoffmann é essa mulher fantástica, que já foi também ministra, já esteve na presidência do Partido dos Trabalhadores.
Então nós podemos ter absoluta certeza que formamos uma grande dupla que se conversa, que combinam e do ponto de vista político são bem representativos, ele deputado federal, ela também deputada federal e senadora.
A senhora chegou a ser sondada para o governo?
Não, eu quero terminar o meu mandato e quero ver se tomo outro rumo na vida, politicamente. Eu já estou no meu sexto mandato de deputada federal, então eu acho que completo um círculo nesse momento.
Esses novos rumos seria, por exemplo, uma candidatura ao Senado?
Pretendo, pretendo.
A senhora foi a única mulher negra como deputada constituinte, em 1988. Hoje, embora não seja mais a única parlamentar, vemos que seguem ataques contra a sua pessoa, como aconteceu ano passado com a sua colega Carla Zambelli (PL-SP). Qual momento a senhora considera mais hostil para uma mulher negra no congresso, em 1988 ou agora?
Olha, ainda é sentida a ausência de mais mulheres negras no Congresso. O trabalho que fazemos politicamente é exatamente para ampliar essa bancada, não só no Congresso brasileiro, mas também nas outras instâncias de poder.
Nós somos a maioria da população brasileira. Então é importante que nós tenhamos o que chamamos de uma paridade.
A minha trajetória foi uma trajetória difícil. Ainda me incomoda, claro, a violência contra as mulheres, e que acontece principalmente com as mulheres negras.
É uma coisa que é inaceitável, a violência doméstica acontecendo, os estupros domésticos, então ainda é muito forte para mim.
Nós estamos avançando, temos um governo que é sensível a essas pautas, com uma estrutura para levar um ministério que cuida dessas questões, mas nós estamos ainda muito aquém da nossa representatividade.
O PT fez 45 anos. Eu sou fundadora do PT, então eu sei que nesses anos nós avançamos do ponto de vista da nossa participação, sabemos também que influenciamos outros partidos. Os partidos não tinham nada de secretaria de mulher, núcleo de mulher, nada disso.
O PT foi o partido que começou a falar das mulheres, dos negros, começou a olhar para a cara do Brasil e ver que esse Brasil de cores e também um Brasil de horrores, porque a discriminação, o processo escravocrata, tudo isso é um enfrentamento difícil para se fazer.
Hoje parece fácil dizer, mas nem sempre foi assim. Em 1988, eu sendo a única mulher negra, eu era a voz do morro na Constituinte, e por aí defendemos a questão da reforma urbana, da reforma rural, reforma agrária, da questão da escolaridade.
Começamos ali a mostrar a cara do Brasil de indígenas, de negros, de negras, e começar a trabalhar os seus direitos na relação de trabalho.
Qual era a relação que nós tínhamos de um crescimento econômico do Brasil sem essas figuras? Não teríamos crescimento porque são a mão de obra que move realmente o Brasil.
E como você avalia o futuro do partido? Para onde deve seguir, mais ao centro ou retomar as bases que fundaram o PT na década de 1980?
Eu acho que o partido continua o mesmo. É preciso que a gente entenda que tem 45 anos desse partido. Ele não é um partido velho, ele é um partido novo. Novo de verdade.
Às vezes colocam que o PT não dialoga com os evangélicos, isso não é verdade. Nós somos evangélicos, estamos dentro do PT e fora do PT tem evangélicos também, em alguns outros partidos que comungam perfeitamente com o projeto do Partido dos Trabalhadores.
Não há nenhuma contradição nisso, nós somos evangélicos e andamos pelo mundo a falar de um Jesus, que é um Jesus que cuida dos pobres, dos desempregados, que cuida bem das mulheres, que cuida bem das pessoas e que não faz acepção de pessoas.
Então nós caminhamos assim e esse é o rumo que o PT tem e é um rumo que nós vamos seguir.
Como você tem visto a reação ao filme Ainda Estou Aqui? Você acredita que ele está alcançando o público evangélico também?
Exatamente isso. Por isso é impressionante que o filme trouxe aquilo que nós não conseguimos fazer até então, que era colocar um diálogo direto com o Brasil que nós temos.
Então, todos que viram o filme, todos que torceram pelo filme, todos nós ganhamos o primeiro Oscar.
E é importante porque o filme fala exatamente dos dias duros da ditadura militar no nosso país, o que aconteceu verdadeiramente com a família. Olha o conceito de família. Olha o que aconteceu com aquela família.
O momento é inspirador, é aproveitável para que a gente possa dar continuidade a tudo que vem acontecendo no Brasil de mentiras, que diz que está tudo bem, que não aconteceu nada, que não teve golpe, que não é nada disso.
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