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Decisão do STF que tornou Bolsonaro réu mostra que ‘o bolsonarismo se esgotou’, diz jurista

Segundo Roberto Tardelli, aceitação da denúncia pela corte evidencia enfraquecimento da extrema

O “bolsonarismo, ele tá num momento em que chegou no fim, ele se esgotou”, afirma Roberto Tardelli, ex-procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo e advogado membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB, a respeito do “desmanche da extrema direita nacional”. Ele se às consequências políticas do iminente julgamento de Jair Bolsonaro (PL) no Supremo Tribunal Federal (STF). O ex-presidente é acusado de orquestrar uma trama golpista logo após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O Três por Quatro, videocast de política do Brasil de Fato, apresentado pelos jornalistas Nara Lacerda e Igor Carvalho, recebeu Tardelli nesta quinta-feira (27). O episódio também contou com a presença de João Pedro Stédile, economista e liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A bancada analisou o andamento do processo contra Bolsonaro pela tentativa de golpe de Estado e a abolição do Estado Democrático de Direito.

Nesta quarta-feira (26), os ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) – Cristiano Zanin, Luiz Fux, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes, relator do caso – acataram a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), tornando Bolsonaro e sete aliados réus.

Além do ex-presidente, passam a responder à Justiça o deputado federal Alexandre Ramagem (PL); o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier Santos; o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres (União); o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno (PRD); o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; o general da reserva do Exército, Walter Braga Netto; e Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência.

Apesar da presença de membros que compõem ou já integraram as Forças Armadas brasileiras, Tardelli reforça que “nós estamos trazendo esses neogolpistas para responder pelo crime que cometeram, que é a conspiração contra a democracia. Esse é o crime”, independente do seu cargo ou atuação dentro da sociedade. 

Bolsonaro e os demais são acusados dos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União.

Stedile reforça que, apesar de parte da parcela conservadora da população apoiar Bolsonaro, boa parte dessa “burguesia que dirige a economia brasileira se deu conta que não haveria mais ganhos históricos se ela mantivesse o seu apoio à extrema direita”.

Ao analisar os impactos políticos para as eleições de 2026, Tardelli ironiza: “o Bolsonaro é muito mais candidato a uma prisão, que vai se estender muito”.

O golpe que saiu pela culatra

Após dois dias de audiência, Bolsonaro foi declarado réu pelo STF. O julgamento mostra que a democracia conseguiu prevalecer, apesar de estar lidando com a maior figura da extrema direita no Brasil.

Stedile também lembra que “nunca haviam sentado no banco dos réus, generais e almirantes”. Tardelli, em concordância, sublinha: “Bolsonaro não é alguém cuja pena é uma abstração.”

Tardelli acredita que as consequências para os acusados não serão leves. Ele calcula que “as penas que serão impostas ficarão próximas à pena máxima”, que podem chegar a 26 anos de prisão.

Por mais que os réus e seus apoiadores tentem minimizar as ações golpistas, Tardelli afirma que eles “reconhecem a existência dessa tramoia toda”. Ele destaca que Bolsonaro chega a se incriminar ao admitir, sem questionamento, que imprimiu a minuta do golpe de Estado.

Além do processo atual, Bolsonaro enfrenta outras investigações, incluindo os casos da Abin paralela, a falsificação da carteirinha de vacinação e o escândalo das joias sauditas.

Mesmo que a prisão de um ex-presidente tenha potencial para mobilizar setores da sociedade, Stedile avalia que “falta consistência para a causa”, visto o enfraquecimento da extrema direita no Brasil. “A burguesia está se afastando do Bolsonaro”, conclui. 

Tardelli concorda e pontua que o avanço das investigações deixa “Bolsonaro cada vez mais sem saída”.

Lembrar para não repetir

O julgamento de Bolsonaro e de seus colaboradores representa uma vitória para a democracia, contribuindo para que episódios similares se repitam. Uma possível condenação dos réus tem potencial para servir de exemplo para que ataques contra a democracia brasileira não aconteçam outras vezes, destaca Tardelli.

“Pela primeira vez em 500 anos, o núcleo duro de um governo golpista foi levado à julgamento”, evidencia Tardelli relembrando que somente nos dias atuais os reacionários sofrem represálias legais por seus atos antidemocráticos.

Tardelli também recorda que “quando nós não julgamos os torturadores, nós criamos uma espécie de cultura de arquivamentos. “Nós criamos um país em que a violência passou a ser admitida.”

Diante do atual cenário da direita conservadora, Stedile reforça que o eleitorado desse espectro político está enfraquecido. “Bolsonaro perdeu a capacidade organizativa para juntar povo” e, agora réu, está ainda mais isolado. 

O videocast Três Por Quatro vai ao ar toda quinta-feira, às 12h, ao vivo no YouTube e nas principais plataformas de podcasts, como o Spotify.

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